segunda-feira, 27 de maio de 2013

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                                                      “OS KENDRICKDADOS E FATOS E

                                      ALGO SOBRE A IMIGRAÇÃO INGLESA PARA O BRASIL"
 
                                                          
                      “PARALELISMOS HISTÓRICOS E DIVAGAÇÕES SOBRE OS TEMAS”
                                                           
1. A ESTRUTURA DA FAMÍLIA  ANTES DO BRASIL                                                         
                                                           
Na segunda metade do século XIX (mais precisamente, em 1873) vieram para o Brasil dois núcleos da família Kendrick liderados pelos irmãos Joseph e Richard (o avô do meu avô, Víctor Agner Kendrick, e a quem nós, em família, chamamos de Richard-pai).                                                     
                                                                                                                                                          
Eles eram filhos do construtor de obras Richard Kendrick (que vamos, então, chamar de Richard-avô) e de sua esposa Elizabeth Smith. Richard-avô nasceu em Birtsmorton em 13 de outubro de 1806, foi batizado em 5 de agosto de 1809 e morreu, também em Birtsmorton, em 21 de abril de 1869, tendo sido enterrado no dia 24 do mesmo mês. Elizabeth Smith nasceu em Dymock, em Gloucestershire, em 1813 tendo sido batizada em 10 de janeiro do mesmo ano.                                .
                                                                                            
Richard-avô e Elizabeth casaram-se em 13 de dezembro de 1833 e tiveram onze filhos, nove mulheres e os dois homens que viriam para o Brasil.                                               
                                                                           
Os seus 11 filhos eram:
                                                          .                                                                                                  
1. Martha Kendrick - nascida em 1833 (em Wellington, Shropshire, Inglaterra), ela trabalhava como costureira de luvas;                                                                          

Observação:

A fabricação de luvas em Worcestershire – de onde os Kendrick vieram - (atividade que remonta ao século XIV) era protegida por leis desde os governos de Eduardo IV, Henrique VIII e Elizabeth I, até que em 1826 foi retirada, pelo governo, a proibição de importação de luvas estrangeiras e as luvas fabricadas na França, muito mais finas e baratas, colocaram a fabricação de Worcestershire em declínio.
                     
Muitas das mulheres da família Kendrick foram “costureiras de luvas” atividade que denominaremos, de agora em diante, só pra abreviar, de “gloveress” – a correspondente terminologia inglesa. 

                                                                                   .
Eventualmente, vou especificar “gloveress“ de luvas de couro. É que não sei se as luvas de Worcester eram sempre de couro e eventualmente, nas fontes, é assim que está especificado. Acredito, no entanto, que as luvas fabricadas em Worcester eram sempre em couro, pois, por mais que consideremos a importância da indústria têxtil britânica, à época dos Kendrick que vieram para o Brasil, a atividade de fabricação de luvas em Worcestershire era muito mais antiga.

Martha casou-se com Christopher Morgan e eles tiveram oito filhos.

Não descreverei toda a sua descendência, mas entre seus filhos está Thomas Morgan, de quem, por ter uma descendente que é minha fonte de informações, vou descrever o seu ramo na árvore genealógica.                                                                       

Thomas Morgan casou-se com Alice Mary Peverill e eles tiveram nove filhos, entre eles, Martin Peverill Morgan. 
Martin casou-se com Clara May Brenan e eles tiveram duas filhas, entre elas, Judith Alice Elizabeth Morgan. Judith casou-se com Ian Dudley Steele, e eles tiveram Rebecca Steele.

Esta menina, Rebecca, entrou recentemente em contato comigo, através do blog, e encaminhou-me, amavelmente, a árvore genealógica de Martha. Também, foi no blog da Rebecca que eu consegui as fotografias das igrejas e dos locais onde os Kendrick moravam... Muitos dos dados que hoje aqui descrevo, também foram conseguidos com Rebecca.                                      
              
2. Mary Ann Kendrick – nascida em 2 de setembro de 1834 (em Ledbury, Herefordshire, Inglaterra); Ela, que, como Martha, era “gloveress”, casou-se com Thomas Williams, um agricultor (também nascido em 1834). O casal teve nove filhos:                                        

2.1. Albert (nascido em 1856);                                     

2.2. Elizabeth (nascida em 1858);                                            

2.3. Charles (nascido em 1860);                                                  

2.4. Alfred (nascido em 1864);                                                          

2.5. John (nascido em 1865);                                                           

2.6. Esther (nascida em 1867);                                                       

2.7. Adelaide (nascida em 1869);                                                 

2.8. Eliza (nascida em 1870) e                                                          

2.9. Alice (nascida em 1874).                                                           

3. Joseph Kendrick - nascido em 19 de dezembro de 1836 em Ledbury, Herefordshire, Inglaterra. Ele morreu (depois de ter vindo para o Brasil com toda a sua família e voltado para a Inglaterra), em Castlemorten, Worcestershire, Inglaterra em 1911.                         

Eu falarei sobre sua árvore genealógica mais tarde, já que temos muitas informações vindas através do Denver, seu descendente, com quem, inclusive, o Vanderley, meu primo, já manteve contato pessoal…

Através do blog entrou em contato comigo, também, outro descendente seu, na Inglaterra, o Mike, de quem falarei mais tarde.

4. Richard Kendrick - (o Richard-pai) nascido em 15 de janeiro de 1839, em Birtsmorton, Worcestershire, Inglaterra, ele morreu de uma febre em Rio das Pedras, Guarapuava, Paraná, Brasil, em 3 de dezembro de 1916, e está enterrado no “Cemitério de Bananas”, no mesmo município. Tenho a cópia de sua certidão de óbito, gentilmente cedida pelo Vanderley.                                        
 
Eu vou falar sobre a sua descendência mais tarde.
                           

5. Elizabeth Kendrick – nascida em 25 de abril de 1841 em Birtsmorton, Worcestershire, Inglaterra;                                         

6. Caroline Kendrick – nascida em 7 maio de 1843 em Birtsmorton, Worcestershire, Inglaterra;                                            

7. Elizabeth Ann Kendrick - nascida em 22 de outubro de 1845 em Birtsmorton (Upton Upon Severn), Worcestershire, Inglaterra;        

8. Selina Kendrick - nascida em 6 de março de 1848 em Birtsmorton (Upton Upon Severn), Worcestershire, Inglaterra. Selina, que era gloveress, como outras mulheres da família, casou-se com Thomas Smith (nascido em Birtsmorton, também).

No censo de 1871, o casal aparece como tendo duas filhas: Elizabeth (3 anos) e Selina (1 ano), ambas nascidas em Birtsmorton.      

No censo de 1881, o casal aparece como tendo somente outros dois filhos vivendo com eles: Alice (11 anos) e Albert (8 anos). Ela nascida em Birtsmorton e ele nascido nos Estados Unidos da América (o que prova que Selina e sua família estiveram Estados Unidos e voltaram para a Inglaterra mais tarde. Eu não conheço mais nada sobre esta história).                         

Observação: os censos ingleses, que acontecem a cada 10 anos, sempre nas dezenas que acabam com 1, são grande fonte de infor
mação.

9. Esther Kendrick - nascida em 22 de abril de 1850, em Birtsmorton (Upton Upon Severn), Worcestershire, Inglaterra, ela casou-se com William Patrick, um agricultor, nascido em 1847. Eles tiveram uma única filha:                                        

9.1. Bethia E. Patrick, nascida em 1871.                                         

10. Louisa Kendrick - nascida em 24 de setembro de 1852, em Birtsmorton (Upton Upon Severn), Worcestershire, Inglaterra, ela morreu quando ainda não tinha dois anos, portanto não deixou descendentes; e

11. Adelaide Kendrick - nascida em 19 de março de 1855, em Birtsmorton (Ledbury), Worcestershire, Inglaterra, ela casou-se em dezembro de 1876 com Charles Price, (nascido em 1859), um trabalhador geral. Eles tiveram três filhos:                                       

11.1. Leticia Ada (nascida em 1881):                            

11.2. Theophitus (nascido em 1885) e                                 

11.3. Beatrice Alice (nascida 1888).                                 

No censo de 1891 a família estava vivendo em Wales (País de Gales), com duas das de filhas de Mary Ann, irmã de Adelaide.     
     
Viver com parentes era muito comum. Acredito que pelas dificuldades financeiras, as famílias eram muito mais próximas, e se ajudavam muito entre si.                               

ILUSTRAÇÕES:

Esta foto é da Igreja de St. Gregory, onde alguns Kendrick foram batizados, se casaram ou estão enterrados:                        

. William (filho de Martha – que eu ainda não citei, pois ainda não citei todos os filhos de Martha) foi batizado aqui em 3 de maio de 1857 e foi aqui enterrado em 21 de fevereiro de 1861. Ele, portanto, morreu antes de completar 4 anos;                             

. Hannah (filha de Martha – também ainda não citada) foi enterrada aqui em 11 de março de 1861, certamente ainda menina;            

Não consegui levantar direito esta história, mas, é muito triste, pois Martha perde duas de suas crianças em menos de um mês.
 
. Joseph Kendrick estava vivendo nesta paróquia em 1861 (antes de ir para o Brasil, portanto).

      2.                  
Esta é uma foto da Igreja de St. Peter & St. Paul, Birtsmorton, onde outros Kendrick foram batizados, se casaram ou estão enterrados:

. Mary Ann Kendrick foi batizada aqui em 2 de setembro de 1838;
. Richard Kendrick (o Richard-pai) foi batizado aqui em 15 de janeiro de 1839;                                      

. Elizabeth Ann Kendrick foi batizada aqui em 22 de outubro de 1845;
. Selina Kendrick foi batizada aqui em 6 de março de 1848;            

. Esther Kendrick foi batizada aqui em 22 de abril de 1850;            

. Louisa Kendrick foi batizada aqui em 12 de dezembro de 1852 e aqui foi enterrada em 11 de setembro de 1854;                                  

. Martha Kendrick e Christopher Morgan se casaram aqui em 4 de novembro de 1851;                         

. Joseph Kendrick estava vivendo em Birtsmorton no censo 1881 (depois de ter voltado do Brasil), assim como sua irmã Adelaide Kendrick e seu marido.                                                 

1.1. A FAMÍLIA DE JOSEPH                                

Joseph, que era pedreiro, casou-se com Harriet Dowding, que era “gloveress” de luvas de couro, em 31 de dezembro de 1857, em Castelmorton, Worcestershire, Inglaterra. Ele tinha 21 anos e ela quase 19.                                                                         

Harriet, que era filha de Charles Dowding e de Eliza Summers, nasceu também em Castlemorton entre julho e setembro 1837 (apesar de não ter sido batizada até 1838). Ela também morreu em Castlemorton em 2 de março de 1916, depois de sua trágica vinda para o Brazil (onde morreram dois de seus filhos)                           

O casal teve doze filhos, ao todo.                                  

Oito destes filhos eles tiveram antes de partirem para o Brasil (observação: todos os seus filhos vivos estiveram no Brasil). Estes oito eram:                                         

1. Joseph – seu filho mais velho nasceu em 5 de dezembro de 1858, cerca de um ano após o casamento. Ele morreu com menos de um ano em 18 de setembro de 1859; Observação: dá pra se notar como era alta a taxa de mortalidade infantil.                            

2. William - nascido em 1860 (observação: em sua certidão de nascimento há um erro, pois ele é tido como filho de Richard e de Julia, seus tios). William casou-se com Caroline Baldwin em 21 de abril de 1879, em Birtsmorton, Worcestershire, Inglaterra;             

3. Sydney - que era um trabalhador geral, nasceu em 1863, em Castlemorten, Worcestershire, Inglaterra, e casou-se com Agness Robinson, em 1882, em Bromesberrow, Gloucester, Inglaterra;

Não vou descrever toda a sua descendência, mas vou localizar Mike, um de meus informantes.

Sydney e Agness tiveram treze filhos, entre eles, Harry.

Harry casou-se com Bertha Goring e eles tiveram dez filhos (a taxa de mortalidade era alta, mas a de nascimento compensava...). O casal mudou-se para Burton Upon Trent, onde mora a família até hoje e onde encontramos muitos Kendrick.                                 

Um de seus filhos era Roy Dennis. Roy casou-se com Kate Elizabeth Underhill e eles tiveram uma filha chamada Sandra.        

Sandra casou-se com Colin Taylor e eles tiveram somente um menino chamado Michael James Taylor.
                          
Este rapaz, Mike, postou um comentário no blog, conforme já citei e nós temos, agora, mantido contato. Mike mandou-me a árvore genealógica de Harry e a de Sydney, também.                           

4. Annie - nascida em 1865, em Castlemorten, Worcestershire, Inglaterra;

5. Albert - nascido em 1868, em Castlemorten, Worcestershire, Inglaterra.

 Não vou descrever toda a sua descendência, mas vou localizar Denver, rica fonte de informações, hoje já falecido.             

Albert casou-se com Ada James em Birtsmorton, Worcestershire, Inglaterra, em 18 de setembro de 1894 e morreu em 1925, em Newent, também Worcestershire, Inglaterra.                                
                                          
O casal teve, pelo menos, um filho, Walter Kendrick, nascido em 1914 na Inglaterra. Este filho casou-se com Patricia Hooper, nascida no mesmo ano e país. Walter e Patricia tiveram pelo menos um filho, Denver.                                                                   

Denver, que já citei, viveu até sua morte, em Worcester, Inglaterra, com sua família (sua esposa Ann e seus filhos Stewart, Scott, Craig e Donna).                                          

Observação: Denver foi  a única ligação que tivemos com nossos antepassados, na Inglaterra, antes do blog.                                      

6. Elizabeth / Elsey / Eliza / Lizzie (observação: derivações do mesmo nome, em inglês) - nascida em 7 de junho de 1868 (há alguma inconsistência, aqui, pois ela não poderia ter um irmão nascido no mesmo ano), em Castlemorton, Worcestershire, Inglaterra, ela casou-se com James Tyler;                                        

7. Alice - nascida em 11 de março de 1870 em Castlemorton, Worcestershire, Inglaterra (e falecida logo à chegada ao Brasil, com cerca de 3 anos, em 1873).                                                               

8. Silas - nascido em 20 de julho de 1871 em Castlemorton, Worcestershire, Inglaterra (e falecido logo à chegada ao Brasil, com cerca de dois anos, em 1873).  

Falarei dos demais filhos de Joseph, aqueles que nasceram após sua vinda para o Brasil e retorno para a Inglaterra, na sequência.

1.2. A FAMÍLIA DE RICHARD (o Richard-pai)                         

Richard, que era construtor, como o seu progenitor, casou-se com Julia Ann Lawrence em 23 de dezembro de 1861, em Ledbury, onde estavam vivendo à época. Ele tinha quase 23 e ela tinha 19 anos. (apesar de que em sua certidão de casamento esteja escrito que ela tinha 21).

Observações:

. A maioria dos lugares aqui citados ficam muito próximos uns dos outros: Ledbury fica a cerca de 10 quilômetros de
Birtsmorton, por exemplo; Birtsmorton fica a cerca de 2 quilômetros de Castlemorton, também exemplificando. A maioria destes locais fica dentro da região (ou condado) de Worcestershire.
                                                     
 
. a cópia da certidão de casamento de Richard-pai e Julia foi, gentilmente, cedida pela Gwen (de quem falarei, na sequência).                                    

Julia nasceu em Birtsmorton, como seu marido, em 28 de julho de 1842. Ela era filha de James Lawrence (também construtor) e de Esther Berrow.                                              

No site “familysearch.com” nós encontraremos uma tal de “Ann Cotton” casada com um James Lawrence, como sendo a mãe de Julia, mas esta mulher não tem nada fazer com a nossa família).

James Lawrence morreu cedo, em 1854, quando Julia tinha somente 12 anos. Esther casou-se pela segunda vez, então, com Ambrose Croft. Este homem, foi quem, então, ajudou a criar uma das filhas de Julia e Richard, quando este último veio para o Brasil.                

Julia era costureira e “gloveress” de luvas de couro, como suas cunhadas, Martha, Mary Ann e Selina, a esposa de seu cunhado, Harriet e muitas outras mulheres da família. Mais tarde, Lillie, filha de Harriet e Joseph, que nasceu na costa espanhola, quando do retorno de seus pais do Brasil para a Inglaterra, trabalhou como “gloveress”, também.                                 

O casal Richard-pai e Julia teve seis filhos:                              

1. George – (meu bisavô) nascido em Castlemorton em 9 de outubro de 1862. Ele morreu em 12 de dezembro de 1902 em Almirante Tamandaré, Paraná Brasil, e está supostamente enterrado, como ainda explicarei, no Cemitério de Tranqueira, no mesmo município;

Possuo a certidão de nascimento de George, gentilmente cedida pela Gwen, mas não possuo sua certidão de óbito, apesar dos esforços para conseguir o documento.                                    

Falarei de sua descendência (nós!!!) mais tarde.
                              

2. Richard – que nós, no Brasil, pra facilitar a vida, já que conhecíamos dois Richards na nossa história, chamamos de “Richard - filho”. Richard-filho, então, nasceu em Castlemorton em 20 de dezembro de 1863 e morreu de uma gripe, em Rio das Pedras, Guarapuava, Paraná, Brasil, em 22 de outubro de 1931, onde está enterrado no Cemitério de Bananas, como seu pai;

 Observações:

. Temos cópia de sua certidão de óbito, gentilmente cedida pelo Vanderley.

. O Richard-pai e o Richard-filho tinham, oficialmente, exatamente o mesmo nome, ou seja, Richard Kendrick. Assim como acho estranho que os dois tenham morrido de gripe, como consta em suas certidões de óbito, acredito que foi este fato, o de possuírem o mesmo nome, que gerou toda a confusão de herança que separou, na sequência a família dos irmãos George e Richard-filho.            

. Não temos (nós os descendentes de George) informações precisas sobre os descendentes de Richard-filho (se é que ele deixou algum).


3. Arthur - nascido em 11 de maio de 1865 e falecido em 26 de julho de 1878, quando ainda não havia completado 13 anos, portanto, não deixando descendentes.                                     

4. Alice Maud Mary - nascida em 20 de junho de 1867 na Inglaterra e falecida em 11 de novembro de 1950 nos Estados Unidos.

Não vou descrever toda a sua descendência, mas, para localizar Gwen, uma preciosa fonte de informações, vou seguir um dos ramos de sua árvore genealógica.                            

Alice casou-se com James Robinson Parry e teve, entre outros, sua filha Violet. Violet casou-se com Richard Edwin Jeffs e é a mãe de Gwen, que vive nos Estados Unidos, e tornou-se amiga de vários membros de nossa família no Brasil.                           


Observação:

Alice tinha cerca de 6 anos quando seu pai, Richard, deixou a Inglaterra vindo morar no Brasil com seus dois irmãos mais velhos, portanto, devia ter memórias bastante claras sobre o que aconteceu à época e na seqüência. Ainda, tendo vivido por tanto tempo, ela faleceu com mais de 82 anos, manteve duradoura convivência (cerca de 16 anos) com sua neta Gwen. Teve, portanto, oportunidade de lhe contar diretamente histórias da família que, agora, Gwen nos repassa, prazerosamente.                               

5. Elizabeth - nascida em 5 de abril de 1869, ela casou com Leonard Brick (filho de George Brick e Esther Taylor). Não temos informações sobre seus descendentes e                                             

6. Eleanor - nascida em 11 de novembro de 1872 (1870, no retrato que possuímos dela). Também não temos informações sobre seus descendentes, somente sabemos que ela mudou-se para o Canadá.

RETRATOS

Estas fotografias que se seguem foram-me enviadas por Gwen e estavam entres as coisas que sua avó deixou, quando de seu falecimento.

                                         Alice, no retrato com uma de suas filhas, supõe-se.                      
                                                                                                                                                                     
                                                     
Eleanor. Como não consta a data no documento, não sabemos se Alice recebeu esta foto antes ou depois que ela foi morar nos Estados Unidos. Não nos é possível saber, então, se Alice manteve ou não contato com a irmã (que ficou na Inglaterra). Esta foto me impressiona sobremaneira, pois a Eleanor me lembra muito a tia Alice (tia da minha mãe).                                                         

Elizabeth com seu marido Leonard. Como os dois já aparentam idade, é de se supor que Alice manteve contatos posteriores à sua chegada aos Estados Unidos com esta irmã (que se mudou da Inglaterra para o Canadá).                                 

1.3. RETORNANDO NA GENEALOGIA                               

Vou, aqui, descrever a genealogia pra trás dos dois irmãos que vieram para o Brasil (retroativamente), até onde consigo chegar (o início do século XVII!!!, totalizando 12 gerações levantadas na minha linha).                                                                                       

1. Richard-avô era o filho de Thomas Kendrick (nascido em 10 de junho - e batizado no dia 1 de julho - de 1770, em Bosbury, Hereford, Inglaterra, ele faleceu em 2 de junho de 1844, em Birtsmorton, Worcester, Inglaterra). A mãe de Richard-avô era Ann Kendrick,  nascida por volta de 1772 ou em 1775 - na mesma localidade de seu marido. Eles se casaram por volta de 1799.     

Thomas e Ann tiveram, ainda, outro filho, além de Richard-avô. Seu nome era Thomas, como o do pai, e ele nasceu em 1805, na mesma localidade do irmão.                                  

Há um outro registro de casamento do Thomas em 3 de julho de 1813, desta vez com uma Anne Pinner nascida por volta de 1780. Com esta mulher, Thomas tem uma filha de nome Amelia, nascida em 1814 e batizada em 10 de julho do mesmo ano. Acredito que sua primeira esposa havia morrido.                                                       

2. Thomas Kendrick, por sua vez, era filho de Job Kendrick e Susanna Williams.                                     

Job Kendrick nasceu em Stoke Bliss (ou Bosbury?), Worcestershire, Inglaterra, por volta de 1730 (ou por volta de 1732), casou-se em Stoke Bliss (ou Bosbury?) com Susanna em 26 de abril de 1755 e foi enterrado em 29 de outubro de 1796 em Bosbury, Hereford, Inglaterra. Susanna nasceu por volta de 1734 e foi enterrada em 8 de abril de 1786, sempre em Bosbury.                                        

O casal teve os seguintes filhos:                                                     

2.1. Hannah Kendrick: ela foi batizada em 11 de julho de 1756, em Bosbury e morreu em 5 de setembro de 1771.                                    .
2.2. Richard Kendrick: ele foi batizado em 13 de abril de 1757 em Bosbury e morreu em 17 de abril de 1757.                                         
2.3. Susanna Kendrick: ela foi batizada em 28 de março de 1758 em Bosbury.
2.4. Ann Kendrick: ela foi batizada em 22 de abril de 1759 em Bosbury.
2.5. Jemima Kendrick: ela foi batizada em 4 de dezembro de 1761 em Bobury.                                            .
2.6. Thomas Kendrick: de quem já falamos anteriormente.

3. Job Kendrick, então, era filho de Ambrose Kendrick (nascido em 1695, batizado em 18 de abril do mesmo ano, em Stoke Bliss, Worcestershire, Inglaterra e falecido em 5 de dezembro de 1776, em Bosbury, Herefordshire) e de Hannah Kendrick.                        

Ambrose Kendrick e Hannah tiveram os seguintes filhos:                

3.1. Richard Kendrick, nascido por volta de 1730, em Stoke Bliss, Worcestershire, Inglaterra e falecido em 17 de fevereiro de 1790;
3.2. Job Kendrick, de quem já falamos anteriormente;                      

3.3. Hester Kendrick, nascida por volta de 1734, em Stoke Bliss, Worcestershire, Inglaterra; e                                                 .                                                                  
3.4. Mary Ann Kendrick, nascida por volta de 1736, em Stoke Bliss, Worcestershire, Inglaterra.                                                         

4. Ambrose Kendrick, por sua vez, era filho de Edward Kendrick (nascido por volta de 1645, em Stoke Bliss, Worcesteshire, Inglaterra e enterrado em 10 de dezembro de 1705, na mesma localidade) e de Mary Kendrick (nascida por volta de 1659, em Stoke Bliss, Worcestershire, Inglaterra).                                     

O casal teve os seguintes filhos:                                                 

4.1. John Kendrick: nascido em 1680 e batizado em 8 de março de 1680 em Stoke Bliss, Worcestershire, Inglaterra;                           

4.2. John Kendrick (outro?): nascido em 1681 e batizado em 19 de fevereiro de 1681, em Stoke Bliss, Heredord, Inglaterra;                 

4.3. John Kendrick (mais um?): nascido em 1684 e batizado em 3 de abril de 1684 em Stoke Bliss, Worcestershire, Inglaterra;             

4.4. Job Kendrick: nascido em 1684 e batizado em 3 de abril de         1684 em Stoke Bliss, Hereford, Inglaterra;                        

4.5. Thomas Kendrick: nascido em 1686 e batizado em 10 (ou seria 20?) de janeiro de 1686/1687 em Stoke Bliss, Wordestershire, Inglaterra;
4.6. Mary Kendrick: nascida em 1690, batizada em 12 (ou seria 25?) de maio de 1690 em Stoke Bliss, Worcestershire (ou seria Hereford?), Inglaterra;                                     

4.7. Ambrose Kendrick: de quem já falei; e                                  

4.8. Richard Kendrick: nascido em 1701 e batizado em 17 de abril de 1701;                                                     

Antes de se casar com Mary, Edward havia se casado (em 4 de julho de 1670) com Cristian Hopkins (nascida em 1649, em Stoke Bliss e falecida em 3 de junho de 1678).                                           

O casal teve um filho:                                                     

4.1. Edward Kendrick, nascido em 1671, batizado em 21 de setembro de 1671, em Stoke Bliss, Worcestershire, Inglaterra e falecido em 15 de fevereiro de 1731/1732.                                       

5. Edward Kendrick, então, era filho de Thomas Kendrick (nascido por volta de 1622, em Hanley William, Hereford, Inglaterra), e Jane Fowlter (nascida por volta de 1624, em Hanley William, Hereford, Inglaterra). Eles se casaram em 16 de outubro de 1644.

6. Finalmente (infelizmente!), o nome do pai do Thomas Kendrick não consegui levantar, mas sua mãe era Margaret Maddocks (que faleceu em 4 de agosto de 1649) e ele tinha um irmão de nome Edward Kendrick, o mesmo nome de seu filho, (nascido mais ou menos no mesmo ano que ele).
                                                     
CONTINUANDO...
 
Os irmãos Joseph e Richard viviam, então, na região geopolítica (condado) de Worcestershire, lugar conhecido como West Midlands (terras ocidentais do meio) da Inglaterra, com suas famílias, quando saíram para tentar vida nova no Brasil.                                                

Muitas das cidades mencionadas neste relatório a respeito dos Kendrick na Inglaterra estão em Worcestershire (Birtsmorton, Castlemorten - onde o lugar chamado Coombe Green se encontra - e Upton Upon Severn, por exemplo).                                            

ILUSTRAÇÃO:

Esta é uma foto da área de Coombe Green (Castlemorton, Worcestershire). Segundo o Vanderley, é área que permanece com a mesma paisagem há séculos e de tão linda e bucólica, os londrinos costumam vir passear na região pra aliviar das tensões das cidades grandes.

Richard Kendrick (avô) estava vivendo aqui com a família no censo de 1841 e no censo de 1851;                                                              

Joseph Kendrick estava vivendo aqui com sua família no censo 1871 e no censo de 1891;                                            

Selina Kendrick estava vivendo aqui no census 1871 com seu marido e família.                                                     

2. POR QUE DEIXAR A INGLATERRA?
                       

Não há como entender o motivo de os Kendrick (ou a maioria das famílias de imigrantes), deixarem seu país, sem conhecer o contexto histórico em que viviam. Claro, podia haver motivos pessoais, também, mas eles não nos são totalmente alcançáveis.                     

2.1. A QUESTÃO ECONÔMICA                                         

A “REVOLUÇÃO INDUSTRIAL”                                              

Eram os tempos do pós eclosão da Revolução Industrial que, iniciada na Inglaterra em meados do século XVIII, expandiu-se pelo mundo a partir do século seguinte.                                 

A Inglaterra saiu à frente no processo da Revolução Industrial por diversos fatores:                                            

1. as grandes reservas de carvão mineral (a principal fonte de energia para movimentar as máquinas e as locomotivas a vapor) que possuía em seu subsolo.                                    

2. as grandes reservas de minério de ferro (a principal matéria-prima utilizada neste período) que também possuía em seu subsolo.       
 
3. a grande capacidade intelectual dos inventores ingleses que, face às circunstâncias, criaram as primeiras máquinas.                         

A máquina a vapor, por exemplo, surgiu da necessidade de se sugar água das minas. A máquina de fiar, da necessidade advinda da confecção de tecidos.                                          

Ou seja a atividade econômica inglesa impulsionou a Revolução Industrial que, por sua vez, impulsionou a atividade econômica.     

4. a burguesia inglesa tinha capital suficiente para financiar as fábricas, comprar matéria-prima e máquinas e contratar empregados.

5. e, muito importante, a mão-de-obra disponível em abundância que havia na Inglaterra.                                                   

A “LEI DOS CERCAMENTOS DE TERRA                        

Esta “Lei dos Cercamentos de Terras”, que havia sido criada muito tempo antes da Revolução Industrial, consistia na transformação das terras comuns aos senhores e servos (proveniente da antiga relação feudo-vassálica) em pastos para as ovelhas, de propriedade particular.

Explicando:
Conceito que vem, ainda da Idade média, vassalo, é aquela pessoa que oferece ao seu senhor fidelidade e trabalho em troca de proteção e um lugar no sistema de produção. Então, o vassalo, além de trabalhar para o seu senhor, tinha um pedaço de terra onde produzir (notadamente, agricultura de sobrevivência). Este pedaço de terra, no entanto, não era de sua propriedade, era de propriedade de seu senhor.      

Este sistema, passado o tempo, evoluiu daquele de senhor feudal/vassalo para um sistema de senhor de terras (arrendador)/arrendatário.

Mas... já antes da “Revolução Industrial”, o valor das terras estava crescendo muito em função do aumento da confecção de lã de ovelhas. A agricultura perdia importância (perdia a importância na Ilha – a Grã-Bretanha - pois era coisa que podia ser desenvolvida nas colônias – o terceiro mundo).                                  

Com a nova Lei, os senhores simplesmente expulsavam os vassalos/arrendatários de suas terras e cercavam-nas, não permitindo que eles voltassem e transformando terras até então usadas para a agricultura, em pasto. E os vassalos (ou servos)/arrendatários ficavam à sua mercê, sem qualquer tipo de apoio ou suporte, sem ter pra onde ir rumando, então para as cidades em busca de sobrevivência.

Com a Revolução Industrial, a indústria têxtil ganhou ainda mais importância e tornou a expulsão do campo ainda mais avassaladora, criando enormes concentrações urbanas. A população de Londres cresceu de 800.000 habitantes em 1780 para mais de 5.000.000 em 1880, por exemplo.                                    

Durante o início da Revolução Industrial, os operários viviam em condições drásticas se comparadas às condições dos trabalhadores do século seguinte. Muitos deles tinham um cortiço como moradia, ficavam sujeitos a doenças terríveis e a jornadas de trabalho que chegavam até a 80 horas por semana. Já no período em que os Kendrick vieram pra os Brasil, a média de horas de trabalho semanais havia diminuido para 53h/s.                                  

O salário era medíocre e tanto mulheres como crianças também trabalhavam, recebendo um salário ainda menor.                              

Nas cidades grandes havia uma quantidade enorme de desempregados ou de subempregados pelas indústrias. Para trabalhadores, no geral, viver era um pesadelo.                         

Este período da história européia revela as conseqüências “da Revolução Industrial”. Muitos livros tratam deste assunto: “ O Capital" de Karl Marx, “Germinal” de Émile Zola, “Les Misérables" de Victor Hugo e muitos outros.                                                     

A pobreza era inacreditável. Um exemplo profundo “do capitalismo selvagem”.                                    
A “LEI DOS POBRES” E AS “CASAS DE TRABALHO”     

A região de Midlands (terras do meio), na Inglaterra, (à qual pertence Worcestershire, de onde os Kendrick vieram), era uma região industrial muito importante. Talvez pudéssemos dizer, até, que este foi o lugar onde nasceu a “Revolução Industrial”.               

A região é chamada, até hoje em dia, de “País Negro“ (Black Country), por causa do carvão que existe na região e por causa de suas chaminés sempre expelindo fumaça preta, constantemente trabalhando (para a indústria da cerâmica, notadamente).             

“A Lei dos Pobres” (the ”Poor Law”), que existiu na Inglaterra desde o século XVI até o século XX, criou as “Casas de Trabalho” (Workhouses), onde as pessoas não capazes de se sustentar viviam e trabalhavam.

Estas “Workhouses” eram terríveis e consideradas, por aqueles obrigados a viver em uma, como verdadeiras prisões (a mim, dão mais a impressão de campos de concentração):                               

- os membros de uma mesma família viviam separados uns dos outros (homens de um lado, mulheres de outro);                       
- as visitas entre eles eram raras e sob a observação dos tutores;
- não havia nenhuma individualidade (os internos eram obrigados a usar uniformes para parecerem todos iguais e também porque assim, diminuíam-se os custos com vestimenta);                                   
- tudo era controlado pelos gerentes;                            
- as “Workhouses” eram cercadas por muros altos;                          
- as refeições eram fracas e silenciosas;                             
- o trabalho era árduo e exaustivo;                                
- não havia qualquer momento de lazer ou diversão;                         
- até mesmo fumar era proibido (hoje já não achamos tão estranho este fato).                                                         

Nas “Workhouses” as pessoas eram tratadas como gado.             

A intenção do governo era fazer a vida daquele que morava e trabalhava em uma “Workhouse” tão terrível que qualquer um faria qualquer tentativa desesperada para conseguir se sustentar, sustentar sua família e sair dali. O que, a maioria das vezes, era algo inalcançável.

No filme “Sweeny Todd” (de Tim Burton, com o Johnny Depp) um musical recentemente lançado, mostra muito bem a atmosfera da época, em Londres. E é muito interessante porque há uma parte do filme em que o menino, criado pelo casal protagonista do filme (açougueiros de carne humana), em um local que é o verdadeiro inferno, diz o quanto ama a sua protetora, pois ela o livrou de viver em uma “Workhouse” – quer dizer: viver em uma “Workhouse” era infinitamente pior do que viver naquele inferno onde ele vivia.                                         

Havia colaboração entre os grandes empresários e o governo para minimizar os problemas gerados pelos pobres. A miséria e criminalidade, especialmente no centro de Londres, chegavam a níveis não toleráveis.                                   

Do meio do século XIX até o seu fim, muitas “Workhouses” foram construídas porque as necessidades estavam ficando cada vez mais altas. No entanto, as “Workhouses” pareciam já não ser suficientes para atender à demanda (por mais rápida que estivesse sendo a sua proliferação).

Uma solução plausível era a emigração dos pobres... a exportação de gente.

A DIÁSPORA INGLESA                                                            

A iniciativa privada e o Governo, então, juntos, colaboraram para favorecer a emigração do país, a disseminação dos ingleses pobres pelo mundo. (é... acho que não seria leviano pensar que este fato, a quantidade de pobres na Inglaterra, tem algo a ver com a “proibição do tráfico de escravos” por aquele país, seria? Nem, tampouco, seria leviano pensar que esta emigração não teria respeitado a critérios mínimos necessários. Ou seria?).        

Reformas na “Lei dos Pobres” passaram a autorizar que as paróquias ajudassem a financiar a emigração dos pobres. Os latifundiários eram obrigados a pagar uma parcela expressiva da ajuda social fornecida pelas paróquias. Essas ajudas eram encaradas como um investimento, que causaria a redução futura dos impostos de assistência, à medida que o problema dos pobres fosse resolvido através de sua exportação.                             

O próprio sindicalismo inglês também subsidiava a emigração. Seu objetivo era reduzir o exército de mão-de-obra de reserva responsável pela depressão dos salários.                                   

O quadro de apoio aos emigrantes era completado por diversas sociedades filantrópicas, dispostas a resolver a questão social inglesa através do incentivo à saída dos pobres.                           

Neste tempo, nós podemos falar de uma “Diáspora britânica”. Muitas famílias inglesas saíram do seu país e vieram para Brasil, ou foram para os Estados Unidos, para a Austrália, para a Nova Zelândia,  para a Índia, para a África do Sul, e também para tantos outros países, com promessas de uma vida melhor.                       

Observação: Tanto Richard quanto Joseph trabalhavam na construção civil (se bem que Richard era mais especializado que Joseph, segundo o que dizia Denver). Eles não eram agricultores, o que os tornava trabalhadores mais especializados. De qualquer forma, o contexto geral da situação da Inglaterra dificultava a vida de toda a população trabalhadora.                                                    

2.2. A QUESTÃO RELIGIOSA                   

Na Inglaterra, a religião oficial é a Anglicana. Lá o Rei exerce, enquanto Estado, papel meramente cerimonial (as vezes do poder executivo cabem ao Parlamento). É o Rei, no entanto, a autoridade suprema da Igreja. (o que mescla, por vezes, as funções do Estado com aquelas da Igreja).                             

Qualquer seguidor de outra religião, que não a Anglicana, era severamente perseguido, notadamente, no período Elizabetano (que se seguiu ao período de Henrique VIII, o seu criador). O anseio pela liberdade religiosa fez, certamente, com que muitas famílias inglesas resolvessem deixar o seu país.                                

A imigração de ingleses para o Brasil, no entanto, acredito, não tinha cunho religioso. Aconteceu já, mais tarde, no período Vitoriano, depois da eclosão da “Revolução Industrial”, e, portanto, a imigração de ingleses, neste período tem cunho notadamente econômico.                                     

A migração dos ingleses protestantes (de outras religiões que não a Anglicana) para os Estados Unidos, iniciou-se muito cedo, desde os tempos em que aquele país ainda era uma colônia inglesa.               

É comum encontrarmos historiadores que atribuem o vertiginoso desenvolvimento econômico dos Estados Unidos à grande quantidade de protestantes que para lá foram.                             

Estes historiadores, estudiosos da questão religiosa, são defensores da máxima: “Enquanto os protestantes trabalham e progridem, os católicos rezam pela salvação de sua alma e aguardam o Reino dos Céus”.

2.3. O ESPÍRITO INGLÊS                         

Acho importante, também, ressaltar o espírito errante do povo inglês. Acredito, mesmo, que, sendo um país com força naval tão importante, as facilidades de locomoção sempre foram maiores e, ainda, acho que o inglês sempre foi um povo de fácil adaptação a outros locais. (Também... quem mora num clima daquele tem que achar qualquer lugar melhor!!!)                               

3. POR QUE VIR PARA O BRASIL?                                            

Vamos esquecer, antes de mais nada, daquela história recorrente de que o imigrante queria ir para os Estados Unidos e, confundido, acabou aportando na América do Sul, porque não acredito, de forma alguma, que esta tenha sido a intenção dos nossos Kendrick (ao menos). Joseph e Richard pretendiam, certamente, aportar no Brasil.        

Para compreender isto é preciso que voltemos lá atrás, no tempo em que o Brasil era ainda uma colônia e visitar, um pouco, também, da história de Portugal.                               

3.1. A INGLATERRA NA HISTÓRIA DE NOSSO PAÍS   

O relacionamento entre Inglaterra e Portugal sempre foi forte. A Inglaterra sempre teve interesses em estabelecer laços com o continente europeu, mas nunca foi amigável nem com a Espanha nem com a França (o que acontece até hoje em dia). Portugal é a opção.                

Diga-se de passagem, França e Espanha, potências, foram, desde sempre, grandes inimigos da Inglaterra (não admira que os franceses odeiem quando alguém chega ao país deles querendo se comunicar em inglês... Já imaginaram alguém, ao chegar à Inglaterra, tentar se comunicar em francês? É... dá pra entender!!!).                      

É interessante notar, também, que a praça mais importante de Londres, a Trafalgar, leva o nome de importante batalha onde os ingleses vencem os franceses na era Napoleônica. Tudo bem!!! Mas precisavam os ingleses não esquecer do assunto e escolher a Estação Ferroviária com o nome da batalha que derrubou, definitivamente, Napoleão, a Estação de “Waterloo”, para ser o ponto de chegada em Londres vindo de Paris, pelo Eurotúnel??? Esta situação (certamente considerada constrangedora pelos franceses), hoje, já mudou com a recente inauguração da Estação de St.Pancras).                                 

Enfim... Portugal foi sempre uma boa escolha para a Inglaterra, pela vizinhança (e por ter sido, quem sabe, sempre, mais vulnerável, também).

A UNIÃO IBÉRICA     
                     
Neste capítulo da história portuguesa, a Inglaterra desempenha papel fundamental na independência de Portugal.                                       

A União Ibérica caracteriza um período da história (entre 1580 e 1640) em que Portugal fica submetido à Espanha, em razão de crise sucessória da monarquia portuguesa. Em 1578, o rei dom Sebastião, morre sem deixar sucessor direto. O cardeal dom Henrique, seu tio, assume o trono e morre dois anos depois, iniciando-se uma crise de sucessão dinástica.                        

O principal pretendente ao trono português é, então, um neto de dom Manuel I, o rei Felipe II, da Espanha. Felipe II impõe sua aceitação como rei de Portugal e é assinado o Tratado da União Ibérica entre as duas Coroas, que formalmente mantêm a autonomia dos reinos, mas na prática submete Portugal à Espanha. Outros dois reis, ainda, seguem-se a este primeiro, no governo da União Ibérica.

O tratado vigora até 1640, quando Portugal recupera plena autonomia, graças ao movimento da Restauração liderado por dom João IV, com apoio da Holanda e da Inglaterra. A submissão de Portugal à Inglaterra é, então, notável.                            

A EXPLORAÇÃO DO OURO NAS MINAS GERAIS           

A mineração no Brasil, marcada pela extração de ouro e diamantes nas regiões de Goiás, Mato Grosso e principalmente Minas Gerais, atingiu o apogeu entre os anos de 1750 e 1770, justamente no período em que a Inglaterra se industrializava e se consolidava como uma potência hegemônica, exercendo uma influência econômica cada vez maior sobre Portugal.

Em contrapartida ao desenvolvimento econômico da Inglaterra, Portugal enfrentava enormes dificuldades econômicas e financeiras com a perda de seus domínios no Oriente e na África, após 60 anos de domínio espanhol durante a União Ibérica.

Dos vários tratados que comprovam a crescente dependência portuguesa em relação à Inglaterra, destaca-se o Tratado de Methuem (Panos e Vinhos), assinado em 1703, pelo qual Portugal é obrigado a adquirir os tecidos da Inglaterra e essa, os vinhos portugueses.

Para Portugal, esse acordo liquidou com as manufaturas e agravou o acentuado déficit na balança comercial, já que o valor das importações (tecidos ingleses) irá superar o das exportações (vinhos).

É importante notar que o Tratado de Methuem ocorreu alguns anos depois da descoberta das primeiras grandes jazidas de ouro em Minas Gerais, e que ele ajudou a determinar o domínio econômico inglês sobre Portugal.                                   

O ouro brasileiro, então, servia para quitar as dívidas de Portugal para com a Inglaterra. A riqueza produzida pela exploração do ouro no Brasil, em outras palavras, passava por Portugal e fixava-se na Inglaterra.                 

AS CONQUISTAS DE NAPOLEÔNICAS                        

Há 200 anos (os Kendrick vieram para o Brasil em 1873... estou falando de uma época anterior, portanto), a situação no Continente europeu era dramático (não para os franceses, claro).

Napoleão estava conquistando e dominando tudo e todos e decidiu decretar o “Bloqueio Continental” (proibição do comércio de qualquer nação com os navios ingleses), numa tentativa de enfraquecer seu grande inimigo.                                                       

D. João VI, de Portugal, sempre amigo da Inglaterra (ou submisso a ela), não tem a intenção de respeitar a determinação francesa e o país é, então, invadido pelas tropas napoleônicas. Enquanto as tropas se aproximam de Lisboa, D.João, receoso, diz à França que vai obedecer ao bloqueio, mas ao mesmo tempo, faz um pacto secreto com a Inglaterra.                                      

Laurentino Gomes (o autor do livro "1808", recentemente lançado) diz que Portugal emprestou da Inglaterra 600.000 libras na ocasião.

Em 1822, quando o nosso país se tornou independente de Portugal, o Brasil herda este débito (que havia crescido para 2 milhões de libras). Pode-se concluir, então, que, quando o Brasil nasceu, ele já tinha, pelo menos, este tanto de “dívida externa”. E esta dívida era para com a Inglaterra.                                             
                   
Enquanto Portugal negociava secretamente com a Inglaterra, a Espanha negociava com a França: ajudaria na invasão de Portugal (permitindo que os franceses passassem por seu território), mas o país seria dividido entre as duas nações. Somente mais tarde a Espanha percebeu o grande engodo em que se meteu, pois estava sendo simplesmente usada pela França. Na seqüência, a França tomaria também, o poder na Espanha, colocando o irmão de Napoleão pra dirigir o seu governo.                                                

É deste período (1814) o quadro de Goya “Fuzilamientos de 3 de mayo” (aquele quadro famoso em que um homem que está sendo fuzilado – em meio a outros - por uma tropa napoleônica, abre os braços bem abertos para receber os tiros). O quadro tem uma estética fantástica (além de uma expressividade extraordinária), pois, característica mais marcante de Goya (o claro/escuro), o homem parece iluminado vestindo uma camisa branca que contrasta violentamente com o escuro do restante da tela.                        

Então... Nós sabemos que, quando D.João VI saiu de Portugal com toda sua corte, vindo viver no Brasil, fugindo de Napoleão, os navios Portugueses foram escoltados pela marinha inglesa. O general Junot, de Napoleão, chega a Lisboa no exato dia seguinte àquele em que D.João VI e toda a sua Corte haviam partido para o Brasil.

Nós recordamos, também, que D.João VI declarou, em 1808, a abertura dos portos brasileiros (até então, como colônia, somente navios portugueses podiam aqui aportar). Claro, ele estava falando em abertura dos nossos portos para os navios ingleses, especialmente (ou haveria de ser para os franceses??? – claro que não.).

O que nós não estudamos na escola é que, quando D.João VI veio para o Brasil, com a sua Corte, ele deixou Portugal abandonado, sujeito a inúmeras invasões e guerras... num absoluto caos.

Portugal tornou-se protetorado inglês por 13 anos (até 1821, quando D.João VI foi obrigado a voltar para seu país – Ver “Revolução do Porto”, a seguir). Na verdade, neste período, Portugal viveu o período conhecido como o de “Guerras Peninsulares” (tendo sofrido três invasões por parte de França).                              

Estas “Guerras Peninsulares” são, então, guerras da Inglaterra contra a França, tendo no início a Espanha de um lado e no final de outro. Tudo isto em território português. Vou repetir: “Guerras peninsulares” são guerras entre Inglaterra e França (com a Espanha confundindo tudo) em território português.                                     

Foi a partir de sua vitória contra a França em Portugal e, na seqüência, de sua vitória em Waterloo, na Bélgica, que a Inglaterra assegura sua hegemonia mundial que irá durar até o advento da Primeira Grande Guerra (não esquecer que entre o período Napoleônico e a I Guerra está a Revolução Industrial).

Enquanto franceses e ingleses continuaram com o seu pujante desenvolvimento econômico, Portugal viu o seu território transformado em campo de batalha, com as suas cidades sendo constantemente pilhadas pelos exércitos estrangeiros e o seu desenvolvimento econômico estagnado. (acho que Portugal sofre as consequências da invasão napoleônica e do abandono por parte de D.João VI, até hoje).                                        

Também importante, considero citar a “Revolução do Porto”, um movimento liberal que culminou com o retorno de D.João VI para Portugal, em 1921. O Porto, cidade Portuguesa, exigia, além do retorno do Imperador, o fechamento dos portos brasileiros a outros países que não Portugal (mas especialmente, à Inglaterra). Esta ameaça, que era como que a recolonização do país, fez D. Pedro declarar a nossa independência.                                   

A PROIBIÇÃO DO TRÁFICO DE ESCRAVOS

A “Lei Bill Aberdeen” foi uma legislação da Grã-Bretanha promulgada em 8 de Agosto de 1845, que proibia o comércio de escravos entre a África e a América. Eram os ingleses legislando sobre o mundo (se achavam, mesmo!!!... esses ingleses.). Não se escondia, porém, por trás deste fato, qualquer tipo de preocupação humanitária.

Após a Revolução Industrial, a Inglaterra passou a contestar a escravidão, interessada em ampliar o mercado consumidor de seus produtos, no Brasil e no mundo (esta frase está escrita conforme a lemos nos livros, porém, como já comentei, acredito que aquilo que a Inglaterra possuia em maior abundância para a exportação, eram os seus pobres, mão de obra concorrente direta com a dos escravos).

De qualquer forma, de que maneira aumentariam, os ingleses, o seu mercado consumidor com a proibição do tráfico de escravos? Ora, diminuindo... a produção alheia!!!                                              

Segundo alguns historiadores, os ingleses defendiam a extinção do tráfico devido à concorrência que o açúcar brasileiro fazia ao açúcar produzido nas Antilhas inglesas. Os ingleses desejavam enfraquecer a produção brasileira, tornar mais caro o produto e ganhar mais mercado para a produção antilhana.                              

Proposta pelo Parlamento, a “Lei Bill Aberdeen” atribuia às embarcações da “Royal Navy” o direito de apreender quaisquer navios negreiros que porventura se dirigissem ao Império do Brasil. De acordo com essa legislação, o tráfico de escravos era considerado como pirataria (mas, os maiores piratas do mundo não eram britânicos?) e, nessa qualidade, sujeito à repressão, independente de qualquer contato prévio entre o Império Britânico e o país responsável pela carga. É a Inglaterra se atribuindo poderes de ONU.                        

Entre 1840 e 1848, a marinha inglesa aprisionou 625 embarcações, carregando milhares de escravos dos quais muitos foram conduzidos às colônias inglesas do Caribe onde, apesar de receberem um soldo, viviam em condições muito próximas à dos escravos.

Entre 1849 e 1851 foram abordadas e destruídas pela “Royal Navy” cerca de 90 embarcações suspeitas de tráfico para o Brasil, muitas em águas territoriais de nosso país. Diz-se que muitas das embarcações foram afundadas com os escravos em seu interior.

A tal da “Lei Bill Aberdeen” feria o Direito Internacional, visto que era uma imposição de um país a outros. A sua aplicação criou inúmeros incidentes diplomáticos com o império brasileiro.           

A extinção do tráfico se deu no Brasil em 1850, por meio da “Lei Eusébio de Queirós”, porém, mesmo após esta data, muitos escravos continuaram a entrar no Brasil em desembarques clandestinos.

Depois desta lei, houve outras como a “Lei do Ventre Livre” (1871) e a “Lei dos Sexagenários” (1885), ampliando a liberdade dos negros, sendo que em 13 de maio de 1888, a Princesa Isabel assinou a “Lei Áurea”, que já havia sido aprovada pelo Parlamento, abolindo toda e qualquer forma de escravidão no Brasil.

O Brasil foi o último país das Américas a abolir a escravidão, porém, segundo historiadores, a “Lei Áurea” não passa de uma farsa, pois, quando foi assinada, só 5% do povo negro vivia sob regime de escravidão.
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A aristocracia escravagista, oligarquia rural arruinada com a abolição sem indenização, culpou o governo por sua situação e aderiu ao Partido Republicano na oposição ao regime. Então, uma das conseqüências da abolição seria a queda da Monarquia.

A economia cafeeira paulista, quando comparada à de outras regiões, não sofreu grandes abalos, pois já se baseava na mão-de-obra livre, assalariada. . Muitos ex-escravos negros permaneceram no campo, após a abolição, praticando uma economia de subsistência em pequenos lotes. Outros ex-escravos buscaram as cidades, onde entraram num processo de marginalização. Desempregados, passaram a viver em choças e barracos nos morros e nos subúrbios.

Historiadores contemporâneos mostram que a abolição da escravatura foi, na verdade, um processo longo, difícil, repleto de lutas e resistências, mas que, em determinado momento histórico, tornou-se inevitável. O nascimento do capitalismo liberal brasileiro, sob forte influência inglesa, via o sistema de produção escravocrata como um obstáculo ao seu pleno desenvolvimento.

A liberdade dos negros tampouco foi acompanhada de sua inclusão social. Os ex-escravos foram deixados à sua própria sorte em uma sociedade fundamentalmente racista. (Acho, até, que se pode fazer uma comparação com o que já havia acontecido na Inglaterra com os “vassalos”... lembra???). Muitos continuaram a fazer os mesmos serviços a troco de comida.                                               

Para se ter uma idéia da estratégia de controle social da época, em julho de 1888 - apenas dois meses depois da abolição - foi apreciado na Câmara dos Deputados um projeto elaborado pelo ministro Ferreira Viana estabelecendo instrumentos de repressão à ociosidade. O projeto previa que os ociosos seriam conduzidos a colônias de trabalho (alguma coisa parecida com as “Workhouses”???), com preferência para atividades agrícolas, onde seriam internados com o objetivo de adquirir o hábito do trabalho.

Dessa forma, para que a liberdade fosse admitida, os negros teriam que, sem meias palavras, permanecer escravos.                             

Enfim, a política abolicionista brasileira não tinha muito de humanitária e atendia, em grande parte, a pretensões inglesas...    

Os negros deixaram de servos das senzalas, onde o seu senhor tinha interesse em mantê-los alimentados e em bom estado de saúde, pra serem servos das favelas, onde, à sua mercê, passam a ter necessidades tanto de alimentação quanto de saúde (entre outras).

A GUERRA DO PARAGUAI                               

Ainda, segundo muitas correntes de historiadores, a Inglaterra teve uma influência fundamental, “na Guerra do Paraguai” (conflito que durou de dezembro de 1864 a março de 1870), envolvendo Brasil, Uruguai e Argentina, de um lado, e Paraguai, do outro.  Há controvérsias, no entanto, quanto à influência da Inglaterra no conflito, controvérsias estas, principalmente apoiadas pelo historiador Francisco Doratioto. Bem... cada um pode tirar suas próprias conclusões.                 

O Paraguai atravessava período de franco desenvolvimento entre os anos de 1811, ano de sua independência, e o ano de 1862. Neste período erradicara-se o analfabetismo, surgem fábricas — inclusive de armas e pólvora —, indústrias siderúrgicas, estradas de ferro e um eficiente sistema de telégrafo. O sistema de distribuição de terras e equipamentos abastecia o consumo nacional de produtos agrícolas e garantia à população emprego e invejável padrão alimentar. Tudo isto de forma autônoma, sem a intervenção de qualquer influência externa.                          

O Brasil, por outro lado, vinha de estabilizar, após longos conflitos, a região do Rio Grande do Sul (Revolução Farroupilha - 1835 a 1845), mas a situação na região era instável, como instável também era a situação no país vizinho, o Uruguai, em função das disputas políticas entre brancos e colorados.                                           

D. Pedro I, então, com receio de que a situação se agrave no país mais ao sul e atravesse fronteiras (atingindo o Rio Grande do Sul, recém apaziguado), faz um ultimato ao governo branco uruguaio (cujo presidente era Atanásio Cruz Aguirre) para que estabalize a situação.

Como o ultimato não é aceito, atendendo a pedido do partido colorado daquele país, o Brasil invade o Uruguai e, em menos de nove meses, depõe o governo branco e empossa o governo colorado, pacificando a situação no vizinho país. (esta é a denominada “Questão Aguirre”- ocorrida em 1864).                             

O Paraguai, por sua vez, sentindo-se ameaçado pela interferência do Brasil em outro país, em represália à atitude brasileira, apreende alguns navios brasileiros e aprisiona sua tripulação (que sucumbe – inteira - face à fome e aos maus tratos).                                

O Brasil, então, rompe relações diplomáticas com o país mais a oeste... Na sequência o Paraguai invade, em novembro de 1864, o Mato Grosso, antes mesmo da declaração formal de guerra, que somente aconteceria no mês seguinte.                            

A Argentina, receosa de invasão do exército do Paraguai que ameaçava entrar no Rio Grande do Sul, exige sua neutralidade. Solano López, dirigente paraguaio, não a respeita, declara guerra à Argentina e a invade com a intenção de apossar-se do Rio Grande do Sul e chegar ao Uruguai onde espera obter o apoio dos brancos.

O Uruguai, no entanto, então governado pelo recém empossado partido colorado, solidariza-se com o Brasil e a Argentina.            

O conflito está estabelecido e é vencido, como sabemos, pela Tríplice Aliança, com conseqüências catastróficas para o Paraguai, que nunca mais se recuperou. O Paraguai tem seu desenvolvimento estagnado, sua população masculina dizimada, suas mulheres e crianças em situação de desespero e miséria.                                

Impressionante, mesmo, é falar com o povo paraguaio e ver a influência que o conflito teve no país, que nós, brasileiros, mal estudamos na escola. Em Assunção há, inclusive, um monumento à mulher paraguaia que lutou na guerra, ao lado das crianças, quando acabaram os homens. Parece superlativo... mas não é.                      

Mas onde entra a Inglaterra?                                  
                       
Bem... O Brasil havia rompido relações com aquele país em 1863, face a incidentes diplomáticos ocorridos em função de atitudes do inábil Cônsul inglês no Brasil, William Douglas Cristie (tem lugar a denominada “Questão Cristie”).                                          

A “Questão Cristie” teve início em 1862 na seqüência do aprisionamento de militares britânicos que, embriagados e em trajes civis, promoviam arruaças nas ruas do Rio de Janeiro. Constatada a sua situação de britânicos, os arruaceiros são imediatamente liberados (vê se pode!!!), mas o Cônsul, não satisfeito, aproveita e exige, além da demissão dos responsáveis pela detenção dos britânicos, pedido formal de desculpas do Governo Imperial à “Coroa” Britânica e indenização por parte do governo brasileiro em função do naufrágio de um navio britânico em nossas costas em 1861 (algo que não tinha nada a ver com a tal situação dos arruaceiros).

Forçando a situação, o Cônsul, então, manda uma esquadra de guerra britânica sair do porto do Rio de Janeiro e aprisionar navios mercantes brasileiros em nossas costas.                        

O Brasil, ameaçado pela força da “Coroa” Britânica, paga a indenização pelo naufrágio do navio britânico, que não era devida, e encaminha a questão dos arruaceiros para ser decidida por arbitramento internacional (a cargo do rei Leopoldo I, da Bélgica).

O governo brasileiro, ainda, encaminha à Inglaterra um pedido de indenização em função da apreensão das embarcações brasileiras e exige pedido de desculpas formal por parte da “Coroa” Britânica pela violação do território nacional.                          

Em virtude da resposta negativa do governo inglês, o Imperador D. Pedro II decidiu romper relações diplomáticas com a Grã-Bretanha em maio de 1863.

Em relação ao arbitramento internacional, o rei belga deu parecer favorável ao Brasil.                                       

Quanto ao pedido de desculpas (a indenização solicitada pelo Brasil nunca foi paga) é muito estranho que este tenha acontecido exatamente no momento em que tem início a Guerra do Paraguai (em 1865). As relações diplomáticas entre as duas nações são, então, reatadas.

Ao que tudo indica, realmente, a Inglaterra tinha interesses na guerra, pois a derrota do Paraguai estancaria o seu desenvolvimento (muito autônomo e ameaçador para o gosto inglês) e asseguraria a sua hegemonia na América Latina. Em paralelo, certamente, a Inglaterra forneceria armamentos aos países da Tríplice Aliança, lucrando com o conflito (sem contar, claro, dado insignificante, que o pedido de indenização pelo aprisionamento de nossos navios mercantes, seria deixado de lado).

Daí a dizer que a Inglaterra influenciou no conflito com o Paraguai, tem distância, mas, como é quase sabedoria popular a sua influência, registro-a.                                                                                          

AS ESTRADAS DE FERRO BRASILEIRAS                            

Algumas de nossas estradas de ferro foram construídas por companhias inglesas.                          

É o caso, por exemplo, da estrada de ferro Santos-Jundiaí (cidade localizada entre São Paulo - capital e Campinas).                             

Em meados do século XIX, pressionado pela necessidade de melhorias no transporte do café (que era transportado em lombo de mulas até o litoral), o Governo de São Paulo aprovou lei de incentivo para aquela empresa que investisse na construção de uma estrada de ferro entre o litoral e o planalto paulistano – atravessando a Serra do Mar, portanto. Concederia a esta companhia, além de benefícios financeiros, 90 anos de sua exploração.           

Vence a concessão, então, o Barão de Mauá, que, juntamente com outros associados, para captar investimentos internacionais, cria na Inglaterra, a “The São Paulo Railway Company Ltda”. "A Inglesa", apelido que caracterizou por muitos anos a ferrovia, foi inaugurada em 1867. (Hoje a chamamos de Estrada de Ferro Santos - Jundiaí).

Esta ferrovia, que tinha bitola de 1,60 m (querendo dizer que a distancia entre os trilhos é de 160 cm), possui quatro trechos onde a declividade é tão acentuada que os trens são puxados por cabos de aço.

Em 1880, no Paraná, inicia-se a construção da Estrada de Ferro que ligaria Paranaguá a Curitiba (ou seja, o litoral ao planalto curitibano – atravessando a Serra do Mar).                                          

Esta, já, foi uma concessão a uma empresa francesa: a “Companie Génerale des Chemins de Fer Brésiliens”.                              

A estrada, de enorme complexidade técnica, como a paulista, apresenta soluções totalmente diferentes para a subida da serra daquela dos ingleses - muitos túneis e viadutos. A obra foi executada pelos Engenheiros Rebouças, dois irmãos (portanto, é plural, mesmo), tendo sido inaugurada em 1885, apresentando bitola métrica (100 cm).                                                  

Citei somente duas das mais importantes ferrovias brasileiras (até nossos dias), mas, são exemplos que ilustram bem, como foi a política desacertada, indiscriminada e sem critérios técnicos de concessões de ferrovias, que criou, o que hoje nós temos como malha ferroviária no Brasil, uma malha muito dispersa e sem interligações entre si; uma malha onde foram seguidos diferentes parâmetros técnicos e, portanto, sem qualquer padronização; especialmente, uma malha de diferentes bitolas e que, portanto nunca se complementarão.                                             

Numa tentativa de unificar as diversas ferrovias existentes no país, o Governo criou, já em 1957, a RFFSA (Rede Ferroviária Federal S.A., hoje privatizada de forma, novamente, compartimentada), para gerir todas as concessões de Norte a Sul do país.                           

Afinal, este país, o Brasil, não conhece a sua história??? Ou será, mesmo que a questão da malha ferroviária brasileira é de uma complexidade tal que não tem solução??? O fato é que, certamente, compartimentar não é a solução.                                           

OUTRAS INFLUÊNCIAS DA INGLATERRA EM NOSSO PAÍS         

Muitas são as influências diretas da Inglaterra na história de nosso país. Citei somente algumas (algumas importantes a meu ver) e somente, ainda, citei algumas acontecidas antes da vinda dos Kendrick para o Brasil. Mas, tem-se muito pra ser falado, ainda:

A “PAIXÃO NACIONAL”                                   

Algo importante é que os britânicos trouxeram o “FUTEBOL” para o Brasil, isto logo depois da vinda dos Kendrick, já na época em que foram implantadas as primeiras ferrovias inglesas em nosso território.

Charles Miller, filho de pai escocês que veio ao Brasil para trabalhar na São Paulo Railway Company e mãe brasileira de ascendência inglesa, pode ser considerado o precursor do futebol no Brasil.
Charles Miller viajou para Inglaterra aos nove anos de idade para estudar sendo que, lá, tomou contato com o futebol. Ele retornou ao Brasil em 1894, tendo trazido na bagagem duas bolas usadas, um par de chuteiras, um livro com as regras do futebol e uma bomba de encher bolas.                                        

Mais tarde o escocês trabalhou na São Paulo Railway como seu pai, tendo se tornado também correspondente da Coroa Britânica e vice-cônsul inglês em 1904.

O primeiro jogo de futebol no Brasil foi realizados em 15 de abril de 1895 entre funcionários ingleses (ou de origem inglesa) de empresas inglesas que atuavam em São Paulo.                                               

Curiosidade:

No início, o futebol era praticado apenas por pessoas da elite (formada especialmente pelos estrangeiros, notadamente, os ingleses), sendo vedada a participação de negros em times de futebol.

Foi durante o Campeonato Carioca de 1914, em jogo do Fluminense contra o seu ex-clube, o América, que o mulato Carlos Alberto cobriu-se com pó-de-arroz para que parecesse branco. Com o decorrer da partida, no entanto, o suor desfez a maquiagem e a farsa foi desfeita . A torcida do América, então, começou a gritar: "Pó-de-arroz! Pó-de-arroz! ". Foi assim que surgiu o apelido para a torcida do Fluminense.

 A ARQUITETURA DO FERRO                                

A nossa arquitetura do ferro tem, certamente, influência inglesa.

A Estação da Luz, em São Paulo, por exemplo, projeto de ingleses, foi erguida somente com material vindo da Grã-Bretanha (desde os pregos e tijolos até a sua iluminação a gás).                                   

A FUNDAÇÃO DE CIDADES                         

Muitas de nossas cidades foram fundadas pela “Companhia de Terras Norte do Paraná” que, por sua vez era uma subsidiária da “Paraná Plantations” (uma companhia particular inglesa). Isto, após as tentativas oficiais frustradas de colonização da região.

Londrina (a pequena Londres), inclusive, foi uma destas cidades e não há como se negar a influência inglesa na arquitetura de suas primeiras construções.                                        

Não me demorarei muito no assunto, pois este fato ocorreu muito tempo depois da época de nosso interesse (o município foi criado em 1934).                                                

3.2. A COLONIZAÇÃO DO SUL DO PAÍS                              

A GUERRA DOS FARRAPOS                           

Em meados do século XIX havia uma grande campanha para a colonização do sul do Brasil, especialmente para a colonização do Paraná e de Santa Catarina, pois que no Rio Grande do Sul, já havia extensas propriedades (pecuárias) e desenvolvimento.                      

O Rio Grande do Sul havia se desenvolvido graças à influência espanhola que se fez sentir no estado mais ao sul, desde a sua formação. A maior contribuição hispânica pode ser considerada, em termos econômicos, a introdução da criação de bovinos no estado, coisa que havia acontecido, lá no tempo dos jesuítas, durante o século XVII, quando estes criaram as “Reduções Jesuíticas” com os índios guaranis e se preocuparam em dispor de grandes rebanhos de gado para garantir a alimentação de seus tutelados.                           

Então, em meados do século XIX, já, tínhamos entre o Rio Grande do Sul (que fazia parte do Império português, porém, com forte influência espanhola) e o estado de São Paulo, (o Império “português propriamente dito”, por assim dizer), um imenso semi-vazio demográfico representado pelos estados do Paraná e Santa Catarina. O risco era muito grande!!!                                       

No Rio Grande do Sul (e envolvendo também o sul de Santa Catarina), inclusive, havia recém acabado a “Guerra dos Farrapos” (1835 a 1845), que, no seu desenvolvimento, tomou cunho separatista. Esta revolta havia se iniciado por questões econômicas, não de independência: a taxação do charque, para o estado do Rio Grande do Sul era maior que para os países vizinhos.                

Não admira o desejo sulista de independência do Brasil, com um sertão como todo o Paraná e toda Santa Catarina os separando da “civilização portuguesa”!!! Aliás, deve ser por este motivo, também, que quem nasce no Rio Grande do Sul é sempre muito mais gaúcho do que brasileiro. São os diversos Brasis!!!

Era urgente a ocupação do Paraná e Santa Catarina ou o Brasil acabaria perdendo o Rio Grande do Sul.                                        

OS CICLOS ECONÔMICOS DO PARANÁ                              

No Paraná, a história da economia, que determina a história da colonização, é dividida em ciclos:                                     

- O ciclo do ouro - isto lá nos anos 1600s... tempo das capitanias hereditárias (quando a região era chamada de Capitania de São Vicente).

Apesar de o ouro não existir na abundância que os europeus (e os colonos) gostariam, sempre, desde antes do descobrimento, acreditava-se que havia ouro no Brasil. E, ele existia, se bem que de forma modesta, e fez nascer cidades como Paranaguá (1648) e Curitiba (1693), por exemplo. A ocupação, na fase do ciclo do ouro, no entanto, partindo-se do litoral, não foi além do primeiro planalto.                                         

- o ciclo das tropas – quando foi descoberto o ouro nas Minas Gerais, todo mundo debandou pra lá, o que influenciou, sobremaneira o desenvolvimento do nosso estado.                          

No início do século XIX os estados do Paraná e Santa Catarina quase que não passavam de caminhos de tropeiros vindos de Viamão (no Rio Grande do Sul) e indo para Sorocaba (São Paulo), onde os gaúchos negociavam sua produção pecuária (que iria alimentar os exploradores do ouro nas Minas Gerais, especialmente).

Logo os paranaenses passaram a trazer gado do Rio Grande do Sul, engordá-lo no Paraná para, na seqüência, levá-lo a Sorocaba para negociá-lo.

Algumas cidades surgiram neste período (século XVIII): Rio Negro, Campo do Tenente, Lapa, Porto Amazonas, Palmeira, Ponta Grossa, Tibagi, Castro, Piraí do Sul, Jaguariaíva e Sengés, entre outras, todas nos caminhos dos tropeiros.                        

Ocupa-se, portanto, o segundo planalto. Havia, no entanto, ainda, muito Paraná a ser colonizado.                          

- o ciclo da erva-mate – circulando pelo Paraná, para dirigir-se a São Paulo, o gaúcho acabou trazendo a cultura da erva-mate (tradicional daquela região), que se adaptou muito bem ao clima do Paraná.

A cultura da erva-mate teve seu apogeu no século XIX e seu declínio determinado com o advento da Segunda Guerra (que impossibilitou a continuidade das exportações – que aconteciam, especialmente para o Paraguai, Uruguai e Argentina).                      

Na seqüência da história economia do Paraná, ainda vieram os ciclos da madeira, o ciclo do café, e o atual (onde se destaca a agricultura da soja e da cana, especialmente, e onde se impulsiona a industrialização e os serviços). Nestes ciclos não vamos nos ater por já estarem além do objeto de nosso interesse.                            
                                      
A EMANCIPAÇÃO DO PARANÁ                   

Impulsionada pela cultura do mate e especialmente, levando em conta a preocupação do Império com a integridade do território nacional, a Província do Paraná foi emancipada de São Paulo em 19 de dezembro de 1853, (não sem represálias por parte dos paulistas, inconformados!!!).

Para compreender a extensão da questão da colonização basta dizer que o primeiro presidente da província, Zacarias de Góis e Vasconcelos, em seu discurso de posse, diz que havia um grande problema a ser resolvido no Paraná: o da ocupação da terra.

O PROGRAMA DE COLONIZAÇÃO                                    

O tráfico de escravos havia sido recentemente abolido (1850). Não havia como, simplesmente vender áreas para grandes produtores e trazer escravos para o trabalho braçal (coisa que havia acontecido mais ao norte). O governo precisava importar proprietários de terra que pudessem e soubessem trabalhar com ela.                       

Acreditava-se que os povos do norte da Europa trariam para o país muito mais desenvolvimento e novas tecnologias do que os povos do sul daquele continente. O que não deixava de ser, de certa forma, verdade, pois era lá que estava acontecendo a “Revolução Industrial”. (não se levava em conta a quantidade de miseráveis que lá se encontrava).                                              

Paralelamente a este fato, havia a intenção de branquear o sul (parece estranho por ser extremamente preconceituoso, mas, é bem isto que os governantes pretendiam: branquear a cor da pele dos brasileiros, segundo alguns historiadores).                             

O governo, então, define um programa de colonização onde se compromete a oferecer várias facilidades, mediante a assinatura de um contrato, àqueles que saíssem de seus países para viver na região do Paraná e Santa Catarina:
                                    
- empréstimo para o pagamento das passagens de vinda até o nosso país;
- empréstimo para a aquisição da terra;                            
- empréstimos para a compra de maquinário e implementos agrícolas;
- empréstimos de dinheiro em espécie, mesmo, para o sustento de toda a família (até que acontecesse a primeira produção agrícola); e
- ainda... caso demorasse o assentamento no Brasil ou houvessem problemas para a primeira produção agrícola, o governo garantia que os imigrantes encontrariam trabalho (na construção das estradas e das pontes);                                         

Fazia parte das obrigações do governo brasileiro, ainda, construir uma escola e uma igreja em cada colônia.                                         

Naturalmente, se supunha que os imigrantes deveriam pagar pelos seus empréstimos. O prazo para o pagamento total da dívida era de sete anos. Acredito, no entanto, que nunca se fez qualquer tipo de pagamento relativo ao contrato de imigração.                       

É estranho que, hoje, ao pesquisar, não encontremos os registros de entrada destas pessoas que participaram das imigrações oficiais para o país, neste período. Não há, nos registros oficiais do Arquivo Público no Rio de Janeiro, qualquer menção a eles (aqui estou me referindo aos Kendrick, que vieram em 1873). Mas... nem identificados, eles eram???                                               

Observação:

Quando nós falamos sobre imigração no Brasil, nós, brasileiros, recordamos mais facilmente, da imigração do fim do século de XIX e do começo do século de XX que se deu, já no tempo do Brasil República, para substituir o trabalho do escravo, após a promulgação da “Lei Áurea” (em 1888).

Estamos falando de um outro fluxo migratório, anterior a este, em que o objetivo era colonizar.                             

Podemos dizer que os imigrantes que vieram para o Brasil em meados do século XIX, o fluxo imigratório da época do Império, então, eram colonizadores, no seu sentido mais estrito… (sendo óbvio, também ter havido fluxo migratório com fins de colonização nos tempos do Brasil Colônia).                                

Em meados do século XIX, o Governo queria pessoas na região sul para definir territórios, promover a integração (do Rio Grande do Sul com o restante do país, especialmente) e garantir a integridade do território nacional (que já havia sido ameaçada pela “Guerra dos Farrapos” e que, na seqüência vai, ainda enquanto acontecia o processo imigratório, inclusive, ser ameaçada pela “Guerra do Paraguai”).

A IMIGRAÇÃO INGLESA PARA O BRASIL                          

Agentes de colonização (pessoas e também companhias) foram, especialmente entre 1868 e 1873, mandados para a Inglaterra (e outros países, também, certamente) para encontrar famílias dispostas a vir morar no Brasil.                      

Como estes agentes ganhavam por cada pessoa que se dispusesse a largar seu país para tentar uma nova vida, e, ainda, pouco conheciam sobre o país que estavam divulgando, então, frequentemente, eles diziam não verdades a respeito do que os imigrantes encontrariam por aqui, já que os ingleses nada sabiam de Brasil. Na verdade, passava-se uma imagem paradisíaca do nosso país.

Os agentes que representavam o Brasil focalizaram suas atenções nas comunidades mais pobres da sociedade, nos lugares aonde o descontentamento era maior. A região industrial conhecida como “Midlands” (de onde vieram os Kendrick), era alvo particular dos agentes assim como também o eram os trabalhadores de fazendas e o povo de cidades no centro-oeste e sudoeste da Inglaterra, especialmente Warwickshire, Oxfordshire, Dorset e Gloucestershire.                 

Antes de receber a documentação de embarque, havia a determinação para que os pretendentes à emigração passassem pelo Consulado Brasileiro em Liverpool para declarar que tinham conhecimento do trabalho de agricultura. Acredito, no entanto, que esta determinação não era respeitada já que a maioria dos imigrantes não tinha habilidades neste campo.                       

Então, os ingleses que acabaram vindo morar no Brasil não eram agricultores, na maior parte dos casos.                                            

Thomas Bigg-Wither, um engenheiro (insuspeito por ser inglês) que, entre os anos de 1872 e 1875 trabalhou no levantamento do estado, como membro de uma expedição anglo-suéca, para a possível construção de uma ferrovia ligando Antonina / Paranaguá aos Andes, publicou, em Londres, em 1878, um relatório que é um retrato da época: “Novo caminho no Brasil Meridional: a Província do Paraná”.                                                   

Ele diz, a respeito dos imigrantes:                                                   

“Dois terços eram evidentemente gente rude da cidade, pois, tanto a fala como a aparência amplamente os denunciava. Entretanto, o Governo brasileiro julgava inocentemente que estivesse importando ‘agricultores ingleses’, bem familiarizados com os métodos aperfeiçoados de agricultura praticados no próprio país’! Pobre Governo iludido!”                                    

Ainda, diz ele:                                                          

“O sistema pelo qual todo esse débito preliminar é acumulado parece, a princípio, ser mau, pois concede uma espécie de prêmio à ociosidade, que os imigrantes preguiçosos logo descobrem e dela fazem uso. Por exemplo, muitos imigrantes que encontrei em Curitiba diziam que, tendo conseguido tudo do Governo, isto é, uma passagem grátis da Inglaterra e todas as despesas pagas em Curitiba, iam trabalhar por conta própria, quando se lhes perdesse a identidade, pois não teriam de pagar o empréstimo da passagem e outras despesas. Conheço de nome diversos imigrantes que assim agiram”.                                                                             

Os imigrantes ingleses eram, então, pessoas não acostumadas ao trabalho pesado nos campos… pessoas que não sabiam tratar da terra...                                                                            
                     
Talvez seus antepassados houvessem sido agricultores, um dia, ainda no período feudal, praticando, quem sabe, uma agricultura de subsistência. Mas a maioria dos ingleses que veio para o Brasil... estes, não eram agricultores. Eles eram, majoritariamente, pessoas miseráveis e muitas vezes, sem instrução, desempregados ou subempregados pela indústria dos grandes centros. Pessoas das quais a “Coroa” queria se ver livre (e estava exportando, como já disse anteriormente, quando falei da Revolução Industrial e da proibição do Tráfico de Escravos).                                                   

Para ilustrar, basta dizer que um imigrante inglês, ao desembarcar no Porto do Rio de Janeiro e observar que a população fala português fica estarrecido, conforme relata em uma carta a sua mãe: “Mas eu pensava que estava indo para a América!!! (referindo-se, certamente aos Estados Unidos)”.                                                 
                                                                                                                        
Os imigrantes que vieram da Alemanha, da Polônia, ou da Itália, por exemplo, estes, sim, estes eram agricultores. Talvez esta tenha sido a grande razão pra ter sido um processo imigratório que resultou em sucesso.

Além de tudo, havia a força do Império Britânico. A imigração inglesa, diferentemente das demais era “assistida” pela “Coroa”. O governo inglês obrigava o governo brasileiro a pagar pelas passagens de retorno à Inglaterra (ou pelas passagens para outros países) quando os imigrantes não ficavam satisfeitos (e eles conseguiam sensibilizar os seus dirigentes). Esta situação desestabilizava ainda mais o processo como um todo.                   

Reproduzo aqui um anúncio publicado no “Labourers’ Union Chronicle” (um tipo de jornal do sindicato de trabalhadores), cujo original encontra-se no Escritório de Dados do Condado de Warwickshire (Warwickshire County Record Office):                    

THE BRAZILIAN CONSUL-GENERAL (IN LIVERPOOL)

Will advance passage and money to every agriculturist,who, with his family, will emigrate to the colonies of BRAZIL, SOUTH AMERICA,  where, besides other favours, he may have, if required, an allowance of two shillings per day while waiting for his first plantation to grow.
                             .
ANY AMOUT ADVANCE WILL BE REPAYABLE BY INSTALMENTS IN SEVEN YEARS OF TIME.              .                                                                  

For further Information, apply to the Brazilian Consulate General, Liverpool.                                                                                            51, SOUTH JOHN STREET.       

O ASSUNGUÍ – POR QUE ALI?                           

A colonização da parte particular de terra no nordeste da Província do Paraná para onde os Kendrick acabaram indo, eu suponho, tem muito a ver com a sua emancipação da Província de São Paulo. Para assegurar seus limites, eu acredito, já que São Paulo não se conformava muito em perder tamanha extensão de terras.

Assunguí (hoje município de Cerro Azul) foi a primeira colônia estabelecida pelo Imperador no Paraná, em 1860, pouco tempo depois da emancipação da Província. Para o Assunguí foram mandados imigrantes ingleses, franceses e suíços além de outros de nacionalidade também européia como alemães e italianos. Perto de Assunguí, em Cananéia, o Imperador estabeleceu uma outra colônia, criada ainda no mesmo ano e pertencendo à Província de São Paulo.

Por que estabelecer duas colônias oficiais tão próximas e de povos vindos da mesma região? Eu suponho que o Imperador queria, apenas, estabilizar as coisas, ajudar a definir as fronteiras entre as províncias do Paraná e de São Paulo.                                                

É preciso lembrar que São Paulo, vinha também de promover uma revolta, a “Revolta Liberal de 1842” e o Governo Imperial, portanto, tomava seus cuidados para não desagradar aos paulistas.

Ainda... por que motivo estabelecer pessoas em Assunguí um lugar terrível para a agricultura? Uma terra caracterizada por montanhas, florestas e rochas… não apropriada para esta finalidade? E ainda… demasiado longe de qualquer grande centro e sem qualquer estrada para se chegar até lá? Esta é a região, acredito, mais pobre do estado inteiro… até hoje em dia!!!                               

Eu acredito que o estabelecimento de uma colônia na posição em que a de Assungui se deu, tem mais a ver com as questões com os paulistas do que com as questões lá do Sul (o medo dos anseios de independência do povo gaúcho).                                     

Em seu relatório (reproduzido pela revista “Monumenta” da Editora “Aos Quatro Ventos”) apresentado a ambas as Casas do Parlamento, elaborado após visita à Colônia de Assunguí, determinada por ordem de Sua Majestade, para verificar porque os imigrantes ingleses estavam insatisfeitos, e queriam, tão frequentemente, sair do Brasil, o Cônsul inglês, Lennon Hunt, relata:                               

“É impossível, nas terras em Assunguy, usar-se senão os implementos agrícolas mais simples. O único pedaço de terra que eu vi em toda a colônia onde seria possível usar-se um arado foi no acre e meio que forma a praça central da Colônia”.               

O Estado precisava ser ocupado, mesmo, mas é uma pena que aquele pedaço específico de terra (aquele que foi cedido aos nossos antepassados ingleses – os Kendrick) não tivesse muito a oferecer (hoje a região já melhorou em função dos incentivos governamentais para as plantações de florestas de pinus e também pelos seus laranjais (e outros cítricos), cultura agrícola que não exige mecanização).                         

3.3. O FRACASSO DA COLONIZAÇÃO INGLESA                     

Os esquemas brasileiros de colonização não tinham um bom controle. Em Assunguí os imigrantes não eram providos com o prometido e nem com o mínimo necessário à sua sobrevivência.

No relatório do Cônsul inglês, do qual já falei, são mencionadas pessoas morrendo de fome, quase nuas por haverem trocado suas roupas por alimento, sem trabalho e, quando trabalhando, muitas vezes, não sendo pagas por ele.                                    

Especialmente, o relatório do Cônsul menciona a enorme falta de recursos para se trabalhar e viver: nenhuma estrada, nenhuma escola, nenhuma igreja, nenhum cuidado médico, nenhuma demarcação de terras, nenhuma semente, nenhuma máquina, nenhuma ferramenta.                            

Muitos imigrantes morreram. A grande maioria voltou para a Inglaterra ou foi viver em lugares como os Estados Unidos, a Austrália, o Canadá, ou outros países.                                 

Nós, aqui no Brasil, não nos damos conta de que houve tantos ingleses tentando a vida por aqui. Mal citamos a imigração inglesa. É que, em nossos, dias, os descendentes destes imigrantes são muito poucos, se considerados os descendentes de imigrações de outros países.

A imigração inglesa para o Brasil, então, foi um grande fracasso. (A não ser por nós (!!!) cujos antepassados acabaram, por acidente, ficando por aqui).                                   

Sem levar em conta que a localização de alguns núcleos coloniais ingleses (como o de Assunguí e Cananéia, por exemplo), foi extremamente mal acertada, já que de alguns deles não se pode reclamar da localização (Kittoland - colônia particular, não oficial -, por exemplo, ficava na região dos Campos Gerais, às margens do Rio Iguaçu, no Paraná e Príncipe D.Pedro - já fracassada em 1870 -, ficava na região de Blumenau/Brusque, em Santa Catarina), podemos concluir:                                

O objetivo do Governo Brasileiro era a colonização. O objetivo dos imigrantes ingleses era livrar-se da pobreza em seu país de origem. A agricultura era somente uma desculpa (ou um meio) pra atingir seus objetivos, de ambos os lados. Ambos os lados se envolveram nesta situação e se viram envolvidos por ela.                                   

Nem o Governo Brasileiro atingiu seus objetivos nem os imigrantes ingleses: O governo brasileiro, que pensava estar trazendo agricultores, novas tecnologias e desenvolvimento para o país e basicamente não foi isso que encontrou nos ingleses e os imigrantes ingleses, que não encontraram aqui o que lhes foi prometido pelas autoridades brasileiras e pelos corruptos agentes de imigração.

De fato, ambos os lados foram demasiado ingênuos, e ambos os lados perderam.                                             

Enfim, quanto a Assungui e Cananéia há que se pensar: “Como poderia dar certo um esquema que trazia não agricultores para trabalhar agricultura em uma terra não agriculturável?”.

Mas, quanto a Kittoland e Príncipe D.Pedro? Ali não se podia reclamar das condições topográficas e das condições de produtividade da terra (enfim... as condições geográficas eram convenientes).

Havia, ainda, a cultura proletária de protesto do imigrante inglês. Assustadas, as autoridades, que não estavam acostumadas com este tipo de cobrança, querem mais é se ver livre de problemas, se ver livre dos ingleses.                           

Ainda, se levarmos em conta que imigrantes de outras origens alcançaram sucesso no processo de imigração, apesar do pouco suporte oferecido pelo Governo Brasileiro, que não houvera de ser ruim apenas para com os ingleses, temos que pensar, que:

A “Coroa”, que interferia de forma direta no processo de imigração (diferentemente do Governo de outros países de onde vieram imigrantes que obtiveram sucesso), sabia das “coisas” e tem sua parcela de responsabilidade.

Afinal, o Império Britânico, sim, somente tinha a lucrar vendo-se livre de seus pobres (!!!), não importando muito a que custo para os outros e, tampouco, quem estivesse sendo atingido...

4. OS KENDRICK - DA INGLATERRA PARA O BRASIL

 PRELIMINARES

Os dois irmãos, Joseph e Richard, provavelmente, devem ter tido alguma notícia sobre o Brasil, na cidade onde moravam, pois como já vimos, a propaganda para a imigração para o nosso país corria solta nas “Midlands”.

Provavelmente, como trabalhadores, sua situação econômica não era boa.

Joseph trabalhava como pedreiro e Richard trabalhava como construtor (era, portanto, mais especializado que seu irmão).

Joseph, então com cerca de 36 anos, decide vir para o Brasil trazendo sua família inteira (sua esposa e os seus sete filhos vivos – com idades que variavam entre cerca de quatorze e cerca de dois anos).
Richard, então com cerca de 34 anos, decide vir com seus dois filhos mais velhos (um com cerca de 10 anos e outro com cerca de 9 anos), deixando na Inglaterra sua esposa e, ainda, quatro outros filhos (três meninas e um menino), com idades que variavam entre cerca de 8 anos e cerca de 6 meses.

Ao que tudo indica, Joseph veio para ficar definitivamente no Brasil enquanto Richard, ou veio para ver como eram as coisas por aqui e depois trazer a Julia (e o restante da família) ou veio para voltar para a Inglaterra.

Não acredito na hipótese da separação, pura e simples. Pelo que conhecemos de seu caráter, através de histórias a nós contadas, por mais que ele tivesse querido se separar de Julia, jamais iria querer se separar de seus filhos. Além de tudo, o sentimento a nós, os descendentes de Richard-pai, transmitido, era de que ele amava sua esposa.

Ironicamente, Richard acabou ficando no Brasil e Joseph foi o que acabou retornando para a Inglaterra. (Segundo Denver, Richard teria melhores possibilidades por aqui, pois que era profissional mais gabaritado que Joseph).

 EM BUSCA DE OURO?!?!?

Gwen, a neta de Alice (irmã de Richard-pai), diz que Richard veio para o Brasil a procura de ouro. Esta, a princípio, me pareceu uma possibilidade remota.

Como é possível alguém vir para o Brasil, especialmente para o Paraná em meados do século XIX a procura de ouro? Faria algum sentido se ele houvesse vindo pra cá entre o final do século XVI e o final do século XVII. Ou, talvez, se ele houvesse ido para as Minas Gerais, no século XVIII.

Mas Richard-pai veio pra cá quase no último quarto do século XIX! Isto não é razoável... Não é compatível com a nossa história!

No entanto, Gwen assegura que Richard-pai veio para o Brasil procurando por ouro. Era sua avó, Alice, filha do Richard-pai, quem contava isso para ela.

Somente quando li uma propaganda da imigração reproduzindo nota escrita pelo cônsul Brasileiro em Liverpool onde ele fala sobre as colônias no Brasil para as quais os ingleses viriam, descrevendo que em Assunguí eles encontrariam ouro, diamantes e minas de chumbo, é que me dei conta de que realmente o que Gwen afirma é verdadeiro.

Observação: Na referida nota do Cônsul, lê-se que Assunguí possui, inclusive, um porto. (Um porto... em Cerro Azul!!! Marítimo que não seria pois está longe do litoral, e, fluvial... mas com aquela topografia, como? Além de tudo, não haviam nem pontes na região!) Dizia a nota, ainda, que lá a terra era propícia à agricultura e à pecuária (mas… com aquela topografia montanhosa e aquele solo rochoso???).

Sim… Richard veio para o Brasil procurando ouro (e pedras preciosas, quem sabe?)...

Richard-pai (como seu irmão, Joseph) vivia, na Inglaterra, uma situação muito difícil economicamente falando. Se considerarmos a situação em que ele deixou Julia e seus filhos, podemos dizer que a situação era desesperadora. De repente aparece o “Eldorado” à sua frente. Richard-pai tinha conhecimentos de mineralogia!!! Ele resolve partir, trazendo para o Brasil somente os filhos mais velhos, aqueles que poderiam ajudá-lo em seu trabalho. Era muito comum as crianças trabalharem já desde tenra idade.

Joseph, provavelmente, via no Brasil a possibilidade de um pedaço de terra, de um trabalho, de uma sobrevivência digna…

Eu me lembro muito bem de meu avô dizendo que o seu avô, o Richard-pai, tinha conhecimentos de mineralogia. Lendo as historietas que meu avô contava e que foram por mim colocadas no papel, quando do ele ainda era vivo (isto a aproximadamente 30 anos) reparo que menciono prospecções feitas por Richard procurando por diamantes e ouro na região de Palmeira.

Sim… não há dúvidas: ele procurava por pedras preciosas. Ainda, quando ele comprou sua propriedade em Guarapuava, mais tarde, esta localizava-se em um lugar chamado de “Rio das Pedras”. Não estaria ele em Guarapuava, procurando pedras preciosas ou ouro, ainda?

Nunca demos muita importância ao fato de Richard-pai ter feito prospecções no Brasil (nós os seus descendente), apesar de sempre termos tido curiosidade de saber o por quê ele havia vindo para cá (tanto que esta foi uma das primeiras perguntas que fiz a Gwen, logo que a conheci). Até a informação fornecida pela nossa parenta americana de que ele veio em busca de ouro, nunca poderíamos ligar um fato ao outro (o fato de ele ter decidido vir para o Brasil ao fato de ele ter feito prospecções aqui). Mas tudo faz sentido, agora!!!

DE LIVERPOOL PARA O RIO DE JANEIRO

Então... Os irmãos Kendrick (e os seus) embarcaram no navio de nome “Chimborazo” e deixaram a Inglaterra em 1873. É importante relembrar que a grande campanha na Inglaterra para a colonização do Brasil aconteceu entre 1868 e 1873, portanto, os Kendrick vieram para o Brasil já no final deste período, certamente em alguma das últimas levas de imigrantes ingleses que aqui aportaram.

Observação: no livro “English, Irish and Irish-American Pioneer Settlers in Nineteenth-Century Brazil” (lançado em 2005 e escrito por Oliver Marshall, um historiador inglês com o apoio da Universidade de Oxford, e rica fonte de pesquisa para o nosso assunto) consta a data de 1873 como a da chegada dos Kendrick no Brasil e, ainda, na certidão de nascimento de William (8 de março de 1875), de quem falarei mais tarde, filho de Julia, consta, também que Richard havia partido para o Brasil há dois anos. Não tenho dúvidas de que a chegada ao Brasil se deu em 1873.
A ilustração do navio foi gentilmente enviada a mim por David Asprey um inglês interessado em história, que pesquisou, na Inglaterra, especificamente sobre os Kendrick, e me encaminhou muitos dados sobre a família.

Este navio pertenceu à “Pacific Steam Navigation Co.” de Liverpool e foi construído em 1871, portanto era ainda muito novo quando da viagem dos Kendrick. A rota desta companhia inglesa partia de Liverpool, passava pela costa brasileira, descia até a Patagônia fazendo o seu contorno e comercializava, então, com os países da costa do Pacífico da América, retornando pelo mesmo trajeto. Não existia, ainda, o Canal do Panamá, que foi inaugurado somente em 1914.

Curiosidade: Em agosto de 1873 quem embarca no Chimborazo com destino a Paris é Joaquim Nabuco e foi no navio que teve início seu tumultuado caso de amor com Eufrásia Teixeira Leite, uma rica e voluntariosa senhora com quem ele nunca se casou, apesar de terem sido noivos por muitos anos.

O livro de Oliver Marshall consta, entre muitos outros fatos e dados importantes, uma viagem, da Inglaterra até o Brasil, feita por famílias britânicas no ano de 1873. Tudo leva a crer que a viagem dos Kendrick foi muito similar (o ano e inclusive, o fato de dois dos filhos de Joseph terem morrido exatamente no trajeto descrito no livro).

Levava-se cerca de três semanas para viajar do Porto de Liverpool até o Porto do Rio de Janeiro (há citações que falam em seis semanas). Os Kendrick aportaram no Brasil, então, em 1873, no Rio de Janeiro, mas, como já mencionei, no Arquivo Nacional daquela cidade, não há qualquer registro de imigração naquele período.

DO RIO DE JANEIRO PARA O SUL

No Rio os imigrantes eram alojados em um lugar denominado “Casa de Saúde” (também conhecido com Hotel dos Imigrantes ou Casa dos Imigrantes) onde permaneciam esperando (algumas vezes por meses) pelo vapor que os levaria ao Paraná. Esta “Casa de Saúde” localizava-se em no Morro da Saúde que fica perto do centro do Rio de Janeiro de frente para a baía de Guanabara, bem próximo ao porto.

Houve um determinado período de tempo em os imigrantes não eram alojados nesta “Casa de Saúde”, no Rio de Janeiro. Foi o período do primeiro surto de “febre amarela” na capital imperial (1849). Durante este período, então, já ao desembarcarem no Porto do Rio de Janeiro, os imigrantes era levados ao interior do Estado, para uma fazenda em Barra do Piraí, onde ficavam, então, aguardando (novamente, muitas vezes por meses) pelo dito vapor que os levaria ao Sul.

No Rio de Janeiro, assim com em Barra do Piraí, as acomodações eram razoáveis e a alimentação era de boa qualidade. Acredito que os Kendrick ficaram na cidade do Rio de Janeiro, mesmo, aguardando seu embarque para o sul.

Finalmente, quando chegava o vapor que fazia a rota para o Uruguai, eles eram levados até Paranaguá.

NO PARANÁ

Em Paranaguá, ainda em função da “febre amarela” no Estado do Rio de Janeiro, segundo o Governo (muitos dizem que era função do simples descontrole do sistema imigratório que ainda não tinha definido onde fixá-los) alguns grupos de imigrantes não desembarcava diretamente no Porto de Paranaguá. Eles ficavam detidos na “Ilha das Cobras” (onde hoje fica a casa de verão do Governador do Estado). Era uma quarentena a que eram obrigados a se submeter.

O desembarque em “Ilha das Cobras” não oferecia qualquer infra-estrutura, pois não se tratava de um porto. Li histórias de crianças caindo ao mar, se afogando e morrendo quando do desembarque.

Em “Ilha das Cobras” não havia qualquer edifício, somente barracas de pano. Os imigrantes ficavam ali alojados por um período que podia variar de 10 dias a mais de um mês. E na ilha fazia calor (muito calor, para os padrões europeus). E além do calor, chovia muito... (à maneira dos trópicos), coisa com a qual os ingleses também não estavam habituados. E eles estavam acampados, sem proteção maior contra as intempéries...

As condições eram terríveis. Muitos morreram em função das condições (de desembarque, de alojamento, de clima e certamente, também de alimentação) em “Ilhas das Cobras”.

Da “Ilha das Cobras” ele eram levados de barco até Antonina, de onde rumavam em caravana (de mulas, provavelmente) até Curitiba.

O livro de “Oliver Marshall”, que cita os Kendrick, relata que um dos filhos de Joseph morreu em Antonina (um de seus filhos mais novos, não cita se foi Alice ou Silas – de três e dois anos de idade, respectivamente). Acredito que esta morte foi causada pelas condições sub-humanas a que eram submetidos na Ilha das Cobras.

A viagem de Antonina até Curitiba levava dois dias, pelo menos. A estrada, na maior parte do caminho apresentava condições muito boas. Foi terminada em 1872, era macadamizada e custou cerca de 180.000 libras. Os pedágios eram bastante pesados.

Curitiba tinha, à época cerca de 4.000 habitantes e num raio de 10 milhas, outro tanto.

Chegando em Curitiba, depois da subida da serra, que por si só, já era uma aventura, os imigrantes eram obrigados a permanecer em outro alojamento denominado de Bariguí, porque o seu lugar em Assunguí ainda não estava preparado (definido ou demarcado – a demarcação das terras era um problema grave).

Este alojamento era o principal centro de recepção de imigrantes do Governo Provincial e situava-se a cerca de cinco quilômetros ao Norte de Curitiba.

As condições deste lugar, na verdade, eram precárias: uma série de barracos de madeira, com dez a vinte metros de comprimento e cinco metros de largura, onde se espremiam oito ou mais famílias.  Condições difíceis ao extremo.

Deduz-se que este alojamento situava-se onde o Rio Bariguí cruza (em algum ponto – já que o cruzamento podia acontecer mais de uma vez) a estrada antiga para Assungui (da qual eu não consigo precisar o trajeto)... isto no bairro hoje chamado de Abranches. O alojamento ficava, então, entre a nascente do rio, em Almirante Tamandaré, e a seqüência de parques que margeiam o Rio Bariguí (o Tanguá, o Tinguí e o Bariguí).

As mortes no local eram comuns e as infecções se espalhavam rapidamente. Os dias no alojamento do Bariguí podiam se transformar em semanas ou em meses.

Foi no Bariguí que morreu o outro filho de Joseph (como já disse, morreu um de seus filhos mais novos, mas não se pode precisar se era Alice ou Silas).

Assim que os loteamentos em Assunguí iam ficando prontos, as famílias eram mandadas para a Colônia. Homens iam caminhando a pé enquanto mulheres e crianças eram carregadas em mulas.

O fato é que, enquanto aguardavam assentamento no Alojamento do Bariguí, os imigrantes ouviam muitas más notícias sobre as circunstâncias na Colônia.

Então, em julho de 1873, (quando os Kendrick poderiam estar envolvidos na situação), segundo notícia relatada pelo jornal “Dezenove de Dezembro”, de Curitiba, após terem, finalmente, recebido a ordem para ir para a Colônia, pelo menos trinta residentes ingleses do alojamento marcharam até palácio presidencial, em Curitiba, quando, em protesto, diziam não querer mais ir para o Assunguí.

Eles alegavam que, após tantos meses aguardando pelo assentamento, o contrato deveria ser considerado quebrado e eles gostariam de ir um lugar melhor, um lugar, especialmente, com um clima melhor onde eles pudessem ser capazes de cultivar os produtos com os quais estavam acostumados na Inglaterra.

Devido a ordens oficiais, no entanto, muitos dos imigrantes deixaram o Bariguí, indo para o Assunguí. Alguns dos imigrantes deixaram o Bariguí e não foram para o Assunguí e alguns daqueles que foram para o Assunguí, desistiram do lugar, não muito tempo depois.

NO ASSUNGUÍ

Depois de irem para a sede da Colônia, no entanto, o assentamento em terras efetivamente suas ainda podia demorar alguns meses. Os imigrantes ficavam na sede, em algum acampamento, provavelmente, aguardando assentamento definitivo.

Quando finalmente eram assentados, construíam suas casas, retiravam a mata da floresta em volta e davam início à plantação. Em muitos casos, no entanto, na sequência, os engenheiros responsáveis pela demarcação das terras averiguavam que os colonos estavam locados em posição indevida e eles eram obrigados a mudar de local suas casas e plantações. Recomeçavam do começo...

Sabe-se que os colonos eram assentados sempre muito distantes da sede da Colônia, cerca de 10 a 20 milhas, no mínimo, o que dificultava muito o seu trabalho. As áreas em volta da sede da Colônia eram destinadas sempre a nativos, coisa que os imigrantes muito reclamavam, pois estas terras não eram cultivadas, muitas vezes, o dono destas terras morava na Capital e, muitas vezes, nem ocupadas estas terras eram.

Para se chegar à sua terra, os colonos eram obrigados a abrir estradas e muitas vezes eram obrigados a atravessar rios que ficavam intransponíveis quando de períodos de muita chuva. Muitas vezes o isolamento era imposto aos colonos face a estas dificuldades. A abertura de estradas e a construção de pontes deveria ser serviço pago pelo Governo Imperial, mas, os colonos eram obrigados a vir até a Capital, a pé, e diversas vezes, pra receber o seu soldo. E muitas vezes ficavam sem receber o devido.

Se chegar à sede da Colônia já era uma dificuldade, imaginem chegar à Capital! A viagem podia levar de dois a quatro dias, e muitas vezes os colonos vinham a pé. A estrada era estreita, lamacenta e cheia de penhascos. A produção, tão batalhada pelos colonos, se perdia em Assunguí por falta de meios para escoá-la.

Caroline Tamplin, colona, em sua declaração feita ao Cônsul Britânico que esteve no Assunguí, descreve:

“Em 1873 a comida distribuída aos colonos era muito ruim; a carne seca estava, quase sempre, cheia de bichos, os feijões frequentemente podres ou mofados; tudo o que foi distribuído era da pior qualidade; entre trinta e quarenta crianças morreram, porque era impossível comer a comida distribuída em 1873.”

5. ENQUANTO ISSO, A JULIA... NA INGLATERRA
                                                       
Como já sabemos, Julia, então com cerca de 31 anos, permaneceu na Inglaterra com quatro de seus filhos, os mais novos, quando seu marido veio para o Brasil. Ela ficou em uma situação financeira terrível, não sendo capaz, nem ao menos, de sustentá-los.

Elizabeth (então com cerca de 8 anos) foi viver com sua avó (e marido), Esther Berrow e Ambrose Croft, enquanto Alice (então com cerca de 6 anos) foi viver com sua tia, irmã de Julia, Alice Lawrence Newman.

As meninas permaneceram com seus parentes até o seu casamento.

Carente de recursos, Julia foi viver, então, em uma “Workhouse” com dois de seus filhos, Arthur, o mais velho, e Eleanor, a mais nova. Ela ainda está vivendo lá no senso de 1881 (sete anos após a partida de seu marido para o Brasil).

Ao que tudo indica quando do falecimento de seu padrasto, Julia foi viver com sua mãe. Julia estava vivendo com ela no senso de 1891 onde ela é descrita como faxineira e sua mãe como lavadeira aposentada. No senso, ela é definida como viúva, como sua mãe, mas, de fato, seu marido estava vivo, no Brasil. Mais tarde vou mencionar porque ela pensava que Richard havia morrido...
                                                          
Esta é uma fotografia externa da “Workhouse de Upton Upon Severn”, onde a Julia foi morar com dois de seus filhos.

Esta é uma fotografia interna de uma “Workhouse da região de Worcestershire”, onde aparecem mulheres usando uniformes e fazendo uma refeição, sempre separadas de seus maridos, pais e irmãos. Pode ser a mesma “Workhouse” onde Julia morou, mas não há maiores especificações.

6. JOSEPH VOLTA PARA A INGLATERRA COM SUA FAMÍLIA

Depois da morte de dois de seus filhos, certamente já em situação desesperadora, Joseph e Harriet resolvem que não querem mais ficar no Brasil com sua família. Mas como retornar ao seu país?
Joseph recorre ao Cônsul Inglês em Santos, M. Charles Dundras, pedindo ajuda para voltar para a Inglaterra.

Como os filhos de Joseph morreram já na sua chegada ao Brasil, antes mesmo de a família ter alcançado Assungui e como eles permaneceram aqui por cerca de um ano, ainda, acredito que este tempo todo Joseph esteve em contatos com o Cônsul na expectativa de retornar ao seu país. Parte deste período eu acredito que Joseph e Richard com suas respectivas famílias, viveram no Assunguí.

São as correspondências entre Joseph e o Cônsul que se encontram hoje no Arquivo Nacional de Londres – departamento de Escritório do Estrangeiro, sob o número de registro FO 128/104/167, que servem de base para as informações sobre os Kendrick contidas no livro de Oliver Marshall. Infelizmente as informações contidas no livro são resumidas (é uma lista dos colonos, tão somente). Para se saber melhor, seria necessário ir ao Arquivo Nacional e fazer a devida pesquisa.

No livro de Oliver Marshall, as informações sobre os Kendrick estão um pouco truncadas: não há o nome da esposa de Joseph, mas aparecem os nomes de seus dois filhos mortos (e o local do acontecido), ao mesmo tempo em que, estranhamente, aparece o nome de George (o, então, menino), como se este fosse casado com Harriet (a esposa de Joseph), e como sendo o pai de seus demais filhos (também nominados no livro). Pode ter acontecido um erro de interpretação dos documentos por parte do Sr. Oliver Marshall, mas, também, pode ter acontecido que Richard estivesse tentando uma forma de mandar seu filho mais velho de volta para a Inglaterra. Somente a leitura dos documentos originais poderá, quiçá, esclarecer.

É interessante notar que é mais simples obter informações sobre os ingleses que vieram para o Brasil e voltaram para a Inglaterra, do que sobre aqueles que ficaram no Brasil. Primeiro, porque não há o registro de entrada deles no país (eu já estive, pessoalmente, no Arquivo Nacional do Rio de Janeiro buscando esta informação). Segundo, porque as correspondências daqueles que pretenderam voltar foram preservadas pelo Consulado Inglês (e encontram-se no Arquivo Nacional em Londres). 
                                                                        .
Segundo historiadores que já fizeram buscas, também não é possível encontrar nada a respeito das migrações inglesas nem no Porto de Liverpool, nem no Porto de Paranaguá e tampouco na Casa de Saúde, onde estiveram hospedados, no Rio de Janeiro.

Enfim... Joseph, Harriet, e agora, cinco de seus filhos (todos os vivos) deixam Paranaguá no vapor “Camões” dirigindo-se ao Rio de Janeiro, onde pegam o navio “Hipparchus” com destino a Liverpool, em junho de 1874.
                                             


                                                   Uma fotografia do navio “Hipparchus”.
Voltando para a Inglaterra, ainda dentro do navio, próximo à costa espanhola, Harriet dá à luz uma menina:

9) Lillie Kendrick, nascida em 25 de junho de l874. Lillie, que se tornou gloveress como suas mãe e tias, casou-se com Thomas Tyler, um condutor de motor de tração. O casal teve um filho, James Tyler, nascido em 1889.

Na Inglaterra, já de volta do Brasil, Joseph terá, ainda, mais filhos.          

Curiosidade:
O livro “Tess of The D'Urbbervilles", de autoria do romancista britânico Thomas Hardy, escrito em 1891, versa sobre a hipocrisia da aristocracia inglesa em meados do século XIX. Muito provavelmente o romancista deve ter lido e sofreu forte influência do relatório do engenheiro inglês, Bigg-Wither, de quem já falamos ou, quem sabe, do relatório do Cônsul Inglês Lennon Hunt, de quem, também, já falamos, pois que, a certa altura do romance, um de seus personagens principais - Angel Claire - emigra para o Brasil (especificamente, Assungui, no Paraná).

Enfim... O romance descreve seu personagem ainda na Inglaterra:


“Andando a esmo, ele observou, nos arredores de uma pequena cidade, uma placa anunciando as grandes vantagens do Império do Brasil... A terra era oferecida em termos excepcionalmente vantajosos. O Brasil, de alguma maneira, o atraiu com uma nova idéia...”.

Já no Brasil, entre muitos outros fatos, o romancista descreve uma cena em que o imigrante ajuda uma mãe com seu filho morto nos braços. Esta cena me faz lembrar muito a Harriet, mulher de Joseph.

Thomas Hardy, ainda, construiu imagens bastante fortes da chegada de Angel à casa paterna, no retorno à Inglaterra: “O jovem inglês está completamente depauperado pelo sofrimento e pelas doenças. Podia-se ver o esqueleto através do homem e quase o espírito através do esqueleto”.


“Tess”, película de um Polanski (1979), estrelado por Nastassia Kinski é baseado nesta novela. Segundo críticos, "Tess" é um filme inteligente, criativo e belo. Extremamente bonito, eu diria, talvez um dos mais bonitos, em termos plásticos, filmes do cinema mundial de todos os tempos. O lance de Angel no Brasil, no entanto, é citado quase que rapidamente no filme.


7. NO ASSUNGUÍ      

                                            
                                 
Esta obra, pintada, à época, por Caroline Tamplin - colona inglesa -, retrata o pedaço de terra cedido à sua família no Assunguí. É interessante porque, com seu traço “naïve”, a obra nos revela a quantidade de montanhas e árvores que tanto dificultaram a agricultura para os ingleses...

Além da topografia acidentada, do solo rochoso, da floresta fechada, da ausência de estradas e pontes, dos assentamentos muito longe da sede da Colônia e especialmente de centros para comercialização de seus produtos, das dificuldades de adaptação ao clima e à alimentação, das doenças, da falta de escolas, igrejas, e suporte médico, da falta de apoio por parte do Governo Brasileiro, os colonos ainda, enfrentavam fortes dificuldades em função das diferenças entre a sua cultura e a dos nativos. Muitos foram os casos de desentendimentos que acabavam por ser resolvidos na polícia.
                                                        
Somente para registrar a passagem dos Kendrick por Assunguí, gostaria de mencionar um fato, dentre os tantos que meu avô contava (infelizmente muito poucos eram sobre os seus antepassados ingleses) que ficou marcado em meu imaginário infantil e que bem ilustra as dificuldades dos ingleses: os colonos traziam os perus que criavam no Assunguí para serem vendidos em Curitiba (quase 100 km de distância), andando a pé e para fazer as aves seguirem andando, iam jogando punhados de milho à sua frente.

8. O FIM DA HISTÓRIA DE JULIA E DE RICHARD

Enquanto vivia na “Workhouse”, Julia teve um filho, William, nascido dois anos depois que Richard deixou a Inglaterra. William recebeu o sobrenome Kendrick e foi criado como sendo filho de Richard, embora não fosse.

Não há maiores detalhes... O que se sabe é que a vida em uma Workhouse era muito dura. A vida de Julia, em especial, foi muito difícil. O pai do filho de Julia, não é sequer mencionado na certidão de nascimento, portanto, se um dia ele foi seu companheiro, certamente, quando a criança veio ao mundo, já não o era mais.

Na cópia da certidão de nascimento do filho de Julia, que me foi gentilmente encaminhada pela Gwen, podemos ler:

nome da criança: William;
data de nascimento: 8 de março de 1875;
sexo: masculino;
mãe: Julia Kendrick.
Observação: O marido foi para o Brasil há dois anos levando os dois filhos mais velhos. A mulher possui outros três. Este agora batizado é ilegítimo.

Julia deve ter ficado grávida ao mesmo em que Joseph estava deixando o Brasil. À época, Julia, além dos dois filhos que estavam com ela na “Workhouse”, e dos dois que seu marido havia levado para o Brasil, ainda tinha suas duas meninas que viviam, uma com sua mãe e outra com sua irmã.

Talvez o fato de encontrar Julia grávida no retorno à Inglaterra tenha feito Joseph, por conta própria, ter dito para toda a família que trazia do Brasil a notícia de que Richard e seus dois filhos haviam morrido. Gwen afirma que, na Inglaterra, todos passaram a acreditar que não haviam mais Kendricks no Brasil. 

Julia morreu de diabetes, em casa de sua mãe, em Berrow, a 29 de novembro de 1895. Quando de seu falecimento, dos sete filhos que teve, um já havia morrido, dois estavam no Brasil, uma nos Estados Unidos, uma no Canadá, e somente dois viviam na Inglaterra. William, seu filho bastardo, permaneceu com ela até sua morte e foi quem providenciou o seu enterro.

A SEPARAÇÃO DA FAMÍLIA
 
A história de Richard-pai e Julia é tão triste... impossível acreditar que eles não se amavam. Acredito, mesmo, que a separação foi circunstancial.

Julia, na Inglaterra, nunca se casou novamente e criou seus filhos amando e respeitando Richard-pai. Até mesmo o filho que ela teve fora do casamento considerava o seu marido, que estava no Brasil, como o seu pai.

Richard-pai, no Brasil, nunca teve outra mulher e criou seus filhos amando e respeitando Julia e o resto da família que ficou na Inglaterra. Muitos membros de nossa família, no Brasil, tiveram os nomes baseados nos únicos nomes da família inglesa que conhecíamos: Julia (como a minha mãe), Alice, Jorge e Richard.

Acredito que Richard-pai soube do filho que Julia teve na Inglaterra. É fato, que nós, no Brasil, nunca soubemos dele. Tampouco sabiam que William não era filho de Richard-pai os descendentes das filhas de Julia que haviam ficado na Inglaterra (pelo menos a Alice não sabia).

Quem sabia do assunto, certamente, era Denver, descendente de Joseph. Foi ele quem contou a história para o Vanderley, que me contou e eu contei pra a Gwen, que ficou muito chateada quando soube. De fato, ela não acreditou e foi atrás de documentos que certificassem o fato, tendo ficado muito abalada quando o encontrou.

Na verdade, havia, por parte de Gwen, uma mágoa muito grande para com o Richard-pai porque ela acreditava que ele havia abandonado Julia na Inglaterra.

Pela reação de Gwen pode-se supor que Julia também acreditava que Richard-pai a havia abandonado. Temos que lembrar que Richard-pai tinha libras esterlinas (pelo menos o Vô Vito falava sobre isso). Deixar sua esposa e filhos em tal penúria, na Inglaterra, somente era razoável se levarmos em conta o sofrimento dos imigrantes ingleses no Brasil. Richard-pai deve ter vivido situações tais no Brasil que não conseguia dar notícias para Julia.

Richard-pai deve ter vindo para o Brasil, ao contrário de seu irmão mais velho, com a intenção de voltar para a Inglaterra depois de ficar rico. Acredito que ele não tenha tido, de início, a intenção de ficar no Brasil.

Pelas cartas de Joseph ao Cônsul ingles em Santos, deduz-se que Richard-pai, ainda, tentou mandar seus filhos de volta para a Inglaterra, sabendo como as coisas poderiam ficar mais difíceis no Brasil. Mas as crianças não conseguiram o retorno. Afinal, conseguir o necessário subsídio não era fácil.

É importante, também, notar que os irmãos Kendrick vieram para o Brasil em uma das últimas levas de colonos inglêses com o incentivo do governo brasileiro. Talvez Richard-pai tenha pensado que o esquema continuaria e, caso precisasse, ele poderia trazer sua família ainda com subsidios.

Na sequência, ele fica sabendo do filho bastardo de Julia. Certamente, esta situação deve ter influenciado na sua decisão de ficar no Brasil em definitivo. Talvez tenha sido quando ele resolveu adquirir as terras de Guarapuava e estabelecer-se. Ademais, para a família, na Inglaterra, ele e seus dois filhos haviam morrido.

Enfim… a família Kendrick do Brasil ficou totalmente isolada dos outros Kendrick até 2004, quando uma prima de Gwen ouviu falar de um médico brasileiro de nome Kendrick que estava dando conferências no Estados Unidos. Foi quando começam a desconfiar de nossa existência. Para tentar esclarecer Gwen entrou no site “family search” perguntando por qualquer descendente de Kendricks no Brasil. Célia, a neta da Bertolina (filha do George) e filha do Zahir entrou, por acaso, no site, e encontrou a mensagem da Gwen.

9. SOBRE OS FILHOS DE JULIA QUE NÃO VIERAM PARA O BRASIL

9.1. ARTHUR

Arthur, o único filho homem de Richard que ficou com Julia na Inglaterra, quando ele tinha 8 anos, morreu cinco anos após a partida de seu pai e irmãos, em 26 de julho de 1878.

Ele tinha recém feito 13 anos e, como trabalhava muito durante o dia, não tinha tempo para se divertir. Foi, então, nadar à noite no Rio Severn, onde afogou-se e veio a falecer.

Isto aconteceu em Upton Upon Severn, Worcester, Inglaterra, muito próximo da Workhouse onde morava com sua mãe, irmã e irmãozinho.

9.2. ALICE
                                                 
                                        Alice e sua inacreditável semelhança com o Vô Vito.
 
Alice mudou-se para os Estados Unidos, em 1892, aos 25 anos.
 
Ela havia sido prometida em casamento por seu tio, aquele que a criou, a alguém que ela não conhecia e que morava nos Estados Unidos. Chegando lá ela não gostou do homem e não se casou com ele. Encontrou, então, com alguém que ela já conhecia da Inglaterra, James Robinson Parry (nascido em 8 de abril de 1846, em Worcestershire). Este homem era, então, 21 anos mais velho que ela. Viúvo, ele tinha 9 filhos.

Alice, então casa-se com James, ajuda a criar todos os seus filhos e cria, ainda, aqueles que teve com ele, outras nove crianças. Uma de suas filhas é Violet, a mãe de Gwen.

Hoje Gwen mora em Sandy, Utah, com sua família.

9.3. ELIZABETH

Sabe-se que Elizabeth mudou-se para Columbia Britânica, no Canadá, antes da morte de sua mãe, ainda. Ela casou-se com Leonard Brick (nascido em 17 de outubro de 1869, em Penolock, em Worcester, na Inglaterra), por volta 1890. Ela morreu em Abbotsford, Columbia Britânica, Canadá, em 11 de agosto de 1940.

Não se sabe sobre sua descendência.

9.4. ELEANOR

Eleanor permaneceu na Inglaterra e casou-se em 1.o. de fevereiro de 1899, aos 27 anos, quase 4 anos após a morte de sua mãe, com William Edward Slade (nascido em 1866 em Exeter, Devon, Inglaterra). Ela morreu em Londres, na Inglaterra, em 1950.

Não se sabe sobre sua descendência.

9.5. WILLIAM

William tornou-se pedreiro, como Richard-pai.

Diz-se que, embora não fosse filho de Richard, após a morte de sua mãe, William veio para o Brasil procurá-lo. Nunca o encontrou. Não se acha qualquer pista sobre ele após a morte de sua mãe nos sensos ingleses. (há a possibilidade de ele ter ficado no Brasil, portanto).

Não se sabe sobre sua descendência.

10. RICHARD DEIXA O ASSUNGUÍ

Já a partir 1872, o Assunguí começou a adquirir má reputação em função de os colonos muito reclamarem das promessas não cumpridas. A partir de 1873 (importante lembrar que já em julho deste ano havia acontecido aquele protesto de ingleses em Curitiba), mas especialmente a partir de janeiro de 1874 começam a ir famílias inglesas inteiras do Assunguí para o Rio de Janeiro. Todos buscam meios para retornar à Inglaterra.

Com receio de desordens e por se sentirem embaraçados com aqueles ingleses maltrapilhos mendigando pelas ruas da cidade, os imigrantes recebem apoio por parte de grandes empresários seus compatriotas sediados na Capital do Império. A Embaixada Inglesa é envolvida e procura frear a vinda dos imigrantes para o Rio, sem sucesso. O Governo Brasileiro também se envolve, pois cada vez chegam mais e mais ingleses do Sul.

De alguma forma, os ingleses começam a sair do Brasil. Por meios próprios (muito poucos), pela ajuda de empresários ingleses e também pela ajuda dos governos da Inglaterra e do Brasil.

 (Observação: lembrar que Joseph retornou para a Inglaterra com a ajuda do Cônsul inglês em Santos).
 
Face a tanta confusão, por ordem da Coroa, o Cônsul Inglês Lennon Hunt vai, em missão, a Assunguí (setembro de 1874), averiguar o que está acontecendo e escreve o relatório que já mencionei (outubro de 1874).

Quando de sua visita ao Assungui, o Cônsul escreve:

A estimativa é de que cerca de 1.000 colonos britânicos tenham chegado a Assunguí. Restam, hoje, somente 293.

O Cônsul, em seu relatório, nomeia todas as famílias que se encontravam na Colônia, uma a uma, quando de sua visita e, mais, faz com que cada chefe de família relate qual a sua situação e assine uma declaração.

Richard não é uma das pessoas entrevistadas pelo Cônsul, portanto, ele não estava mais no Assunguí quando de sua visita.

Supõe-se que, enquanto Joseph e sua família deixam o Brasil em junho de 1874, Richard e os seus deixam o Assunguí, quase que na seqüência (ou até mesmo juntos), pois em setembro do mesmo ano, eles já não mais lá se encontravam.

EM CURITIBA

Richard vem para Curitiba com seus dois filhos e começa a trabalhar como pedreiro. Sei, através de relatos de meu avô, de pelo uma obra, deste período, que ele construiu adiante de São José dos Pinhais.

Não tenho noção de onde moravam, mas, meu avô costumava contar uma história que descrevia como os meninos teriam sido seqüestrados.

11. JOSEPH TEM MAIS ALGUNS FILHOS

Quando de volta à Inglaterra, Joseph e Harriet têm mais três filhos:

10) Isabel Emily - nascido em 1876, em Castlemorton. Casou o Henry Amphlett em fevereiro, 8o 1908 de George em Britsmorton, Worcestershire, Inglaterra;

11) Walter James e - nascido em 1878 em Castlemorton. Morreu junho em 24o 1905 em Britsmorton e

12) Gilbert - nascido em 1879 em Castlemorton.

12. OS TRABALHOS DE RICHARD-PAI

A ponte do Rio dos Papagaios é tombada e considerada Patrimônio Nacional (processo 42/773 do “Departamento do Patrimônio Histórico e Artístico do Paraná). Na família ela é tida como construída por Richard-pai, se bem que não há nada nos registros que o ligue a ela.

O que se tem de dado concreto é que ela foi projetada por Francisco Antônio Monteiro Tourinho, engenheiro militar, à época do Presidente da Província Lamenha Lins. Sua construção deu-se entre os anos de 1876 e 1877 e sua inauguração, com a presença real, deu-se em 1880. Nos relatórios históricos consta a ponte como construída por imigrantes alemães. Acredito que Richard-pai deve ter se misturado a eles.

 
A Estrada do Mato Grosso (que nunca chegou ao Mato Grosso), entre Curitiba e Palmeira, também é tida, em família, como obra sua. Também não há registros que o liguem à referida Estrada.

De acordo com o que o Vô Vito contava, a Estrada do Mato Grosso começava, em Curitiba, exatamente onde a Rua XV de Novembro cruza com a Rua Doutor Muricy. A Rua XV acabava ali onde haviam casas que tiveram que ser demolidas (talvez por esta razão, a partir dali, a Rua XV passa a se chamar Avenida Luiz Xavier).

A Estrada seguia o caminho da Avenida Comendador Araújo, ia pela Avenida Batel, Avenida Nossa Senhora Aparecida, até chegar à Rua do Mato Grosso. Dalí, chega-se à Ferraria, onde a Estrada nova para Palmeira cruza, pela primeira vez, com a antiga.

Na família, também é atribuído a Richard-pai, o relógio de sol da Praça Tiradentes (sobre a Farmácia Stellfed). A data escrita sobre o referido relógio (1857) deve ser uma alusão à inauguração da farmácia, que aconteceu ainda em outro edifício (no Hospital Santa Casa), pois neste ano Richard-pai ainda não havia chegado ao Brasil.


 

Quem sou eu

Vera Regina da Cruz